segunda-feira, 31 de outubro de 2011

CHORO

O choro
lava a alma
acalma
abranda
encanta
constrói
destrói
parte de minha alma
parte que acalma

JUSTIÇA

Justiça
omissa
submissa
realista
futurista
Justiça
luta
enluta
enfraquece
falece
adormece
anoitece

NUDEZ

Minha nudez
é uma prova de minha insensatez
Minha nudez
é a mostra de minha timidez
Minha nudez
é a prova viva
aflita
aviva
de fazer pulsar
minha alma

AMOR À VIDA

O silêncio toma conta dos Martins. Todos aguardam com apreensão um telefonema que pode vir do hospital. Ernesto, pai de Eduardo, sofreu um acidente vascular cerebral e está em coma na Unidade de Terapia Intensiva. Ele dá força para sua mãe. Ana Maria não tem forças para seguir a vida, para seguir o restaurante que tem com o marido. Eduardo é um jovem muito forte, muito decidido. Maduro para sua idade, teve que passar a desempenhar a administração do restaurante junto com seu irmão João Pedro e sua mãe. A família tinha que seguir a vida. Seu Ernesto lutava pela vida. Todos tinham fé que ele iria vencer este episódio doloroso.

O telefone toca. Eduardo corre para atender:

- Alô, boa noite, quem fala?
- Boa noite, aqui quem fala é a enfermeira Miriam. Falo do hospital de Caridade. Estou ligando para informar que o senhor Ernesto teve uma melhora. Ele saiu do coma, abriu os olhos e pediu para chamar a família aqui. Vocês podem vir aqui no hospital?
- Claro, com certeza. Já estamos indo para aí.

Eduardo corre ao quarto de sua mãe:

- Mãe, vamos já para o hospital!
- O que houve, meu filho? Seu pai, ah, ele piorou?
- Não, mamãe, ele acordou do coma. Ele acordou e quer nos ver.
- Meu filho! que notícia maravilhosa! Eu quero ver seu pai sim. Me dá uns minutos, vai tirando o carro da garagem. Vamos para o hospital, agora.
- Posso chamar o João?
- Pode sim. Vamos todos. Vá acordar o seu irmão. É madrugada, está frio.Mas não vamos deixar de ir ao hospital, de jeito nenhum.

Todos se vestem rapidamente. Eduardo tira o carro da garagem e todos vão para o hospital. A noite estava fria, mas o calor aquecia o coração de todos. Queriam realmente ver o seu pai. Ana Maria queria ver e ficar perto do companheiro por mais de 40 anos de casamento.

Doutor Peixoto os recebe no corredor:

- Que bom que vocês estão aqui. Estou muito feliz. Ernesto acordou. Está querendo falar com todos. Eu vou deixar entrar um por vez. Não é hora de visitas, mas a situação é especial. Eu estou aqui e já conversei com a madre superior sobre o caso.

Ana Maria entra primeiro. Vai até a beira do leito onde o marido está. Ainda tem aparelhos ligados a seu corpo. Os monitores acompanham o ritmo do coração, os batimentos, a pressão arterial. Uma bomba de infusão ministra o soro e também os demais medicamentos para evitar a coagulação do sangue. A máscara do oxigênio é afastada um pouco do rosto de Ernesto. Assim que ele vê a esposa, a companheira de uma vida, ele sorri. Milagrosamente, começa a falar:

- Meu amor, que saudade. Voltei, estou vivo. Eu vou me levantar desta cama em breve!
- Vai meu velho. Com certeza. Que susto tu nos deu. Nós pensávamos que tu irias não voltar mais. Como eu vou viver sem ti! Eu preciso tanto de ti, do teu amor. Preciso do teu calor, da tua companhia na hora do mate no fim da tarde, dos nossos passeios no parque, das nossas viagens para a praia no verão. E do teu abraço, do calor do teu beijo...
- Ana, eu te amo da mesma forma a qual te amei. Desde quando tu eras uma menininha. Fazia o Normal. Namoramos, noivamos, casamos. Temos nossos filhos. E meu amor não mudou. Tudo permanece igual. É por isto que sou feliz. Que me sinto feliz, me sinto pleno e próximo de ti.

- Eu te amo, minha velha. Te amo muito!
- Eu também, meu velho.

Ana Maria sai chorando da UTI. Se abraça ao seus filhos e diz:

- Graças a Deus, nosso Ernesto escapou. Ele está vivo. Ele vai viver, ele vai viver e é um milagre, é um milagre!

Ricardo e Eduardo também se abraçam e choram. Todos ficam felizes por ver a recuperação de Ernesto. Um pai amigo, um pai exemplar. Um homem batalhador, que deu sua vida para a família e para o restaurante. Bem frequentado e no centro de Santa Maria. Cidade a qual vivia, desde que veio da fronteira oeste com sua esposa e com os dois meninos, ainda pequenos.

Ernesto sobrevive, tem alta e, depois de quase um mês de internação, vai para casa. Em um momento, pede para que Eduardo o leve no restaurante. Queria realmente pisar no local onde tira o seu sustento e onde criou seus filhos, fez amigos, ajudou a construir o patrimônio gastronômico de Santa Maria. A noite estava caindo e o restaurante estava com as cadeiras levantadas, colocadas com o assento virado para as mesas. O ambiente estava limpo, mas faltava voltar a abrir. Todos aguardavam o retorno de Ernesto para retomar as atividades naquele espaço.

Ernesto entra sozinho no restaurante. Puxa a cadeira e se senta. Como em um momento, toma um grande susto. Vê uma luz branda, uma luz, um clarão baixo entrar pelo salão, adentrando aquele espaço. A imagem de uma moça, cândida, com um olhar terno, uma moça negra, envolta em um manto com as cores da bandeira do Brasil e com uma coroa brilhosa, feita com ouro, vem até o comerciante. Vem e fala:

- Foi o amor, o amor de todos que te trouxe de volta, querido Ernesto. És um pai exemplar, um marido amável e zeloso. Uma pessoa querida por todos nós. Ernesto, você merece mais uma chance. A chance de ver realizar um grande sonho seu. O sonho de ter um neto, de levá-lo ao futebol, levá-lo a pescar. Realizar também o desejo de Ana. Uma criança para brindar no seio da tua família.

- Virgem! Virgem Santa! Não acredito que tu estás aqui. Que tu se materializou em minha frente. Achava que tu jamais viria aqui. Nos momentos de minha dor, quando achei que não iria sobreviver e resistir ao derrame, eu achava que não ia voltar. Eu chamei por ti. Minha santinha!

- Eu vim, querido Ernesto. Eu vim para dizer que as tuas orações chegaram a mim. Eu te atendo e vim aqui para dizer que também estou feliz, como a tua família, com a tua volta. Você é importante para todos nós. Agora, com saúde, se recuperando, vai reabrir o restaurante. Obrigado por me chamar nos momentos mais difíceis da tua vida. Porque aqui eu estou. Eu vim para responder as tuas orações.

- Nossa Senhora Aparecida! Minha santinha! Minha santinha negra, santinha que vive no meu coração desde criança. Santinha dos brasileiros, minha santinha, obrigado por vir aqui. Obrigado por me acolher, obrigado por receber as minhas preces, o meu pedido pela vida. Eu tenho muito amor pela minha vida, pela minha casa, pelas minhas coisinhas. Eu aceitaria se fosse a vontade de Deus em partir. Mas ficaria com saudade de todos que aqui ficariam. Mas voltei, e vou continuar te tendo em meu coração. Tu vais continuar sempre no altar, ali no alto da portada que vai para a cozinha. Tu és a minha santinha, e tu existe..

- Bem, Ernesto. Está na hora de voltar. Voltar para casa, para junto de Deus. Mas saiba, Ernesto, sempre estarei contigo. Tua volta foi um milagre. Uma prova de amor à vida. Amor as coisas, amor a tudo o que te recebeste. Meu filho, fica com Deus, me dê a tua mão. Eu agora volto para o céu. Ernesto, meu filho, meu amado filho, fica em paz.

A santinha parte e Ernesto se põe de joelhos a chorar. Ele realmente viu e presenciou Nossa Senhora em sua frente. Viu e ela apareceu lhe trazendo a boa nova. Alguns meses se passaram e Eduardo veio comunicar a gravidez de sua namorada, Fabiana. Ela estava grávida de dois meses. A notícia foi de comemoração para a família. Eduardo casou com Fabiana e a fala de Nossa Senhora se cumpriu. Os meses se passaram e veio um lindo menino. Mateus nasce para a alegria e a felicidade de seus pais e de seus avós.

E os anos se foram e uma linda imagem foi registrada no livro da vida. Seu Ernesto foi até a barragem pescar. Quem lhe fez companhia? seu amado netinho, Mateus. Os dois sentaram na beira de um pontilhão e ali ficaram, avô e neto, esperando os peixinhos fisgarem a isca.

Amor à vida

domingo, 30 de outubro de 2011

UM AMOR ESCRITO À BEIRA MAR

Luiza acordou pé por pé. O dia estava raiando e ela queria ver o sol nascer na beira do mar. A casa onde morava ficava na beira da praia. As ondas beijavam os seus pés. O barulho do mar era uma bênção para os seus ouvidos. Luiza sempre acordava antes do sol raiar. Saia com seu velho pai para empurrar o barco. Ele e seus primos iam para o alto mar buscar os peixes para vender na praça do vilarejo, junto com outros pescadores. Luiza se criou na pequena São Miguel. Um vilarejo pequeno do litoral de Santa Catarina. Uma igreja, na pracinha principal do lugar. Ali tudo acontecia. Luiza, a bela morena, faceira, caiçara, criada no lugar. Era a filha mais velha das cinco filhas do seu Silva.

A bela morena acordou e foi ver o mar. Tirou as sandálias e foi caminhar descalça, sentindo a brisa. O vento soprava leve, o dia prometia ser quente, como uma típica manhã de verão. Seu pai não tinha saído para o mar naquele dia. Era época do defeso e os pescadores recebiam para ficar em casa. Em período de reprodução de peixes, a família improvisava a sobrevivência. Dona Maria, a mãe de Luísa, fazia artesanato para vender. Tinha as filhas menores para ajudar no ofício. Seu Silva aproveitava o período para trabalhar no único restaurante da vila. Fazia um pouco de tudo. Ajudava a servir as mesas, ajudava na cozinha, no que fosse realmente preciso.

Luiza trabalhava na única pousada do lugar, mas estava de folga naquele dia. O final de semana foi agitado. Com o verão, muitos turistas chegam na pequena São Miguel. Trazem dinheiro e sobrevivência para os nativos, que do mar dependem para viver.

De pés no chão, correu, chutou as ondas. Brincou numa ciranda, como se criança fosse, lembrando das estrepulias que fazia em São Miguel. Das vezes em que subia no pé de jabuticaba para comer fruta, dos mergulhos na praia, das vezes em que jogava futebol com os meninos, brincava de casinha com as irmãs. Luiza era uma moça faceira, vistosa, sempre com vestidos coloridos, cabelos negros soltos, entregues ao vento. Um rosto de feições delicadas, que não perdia a leveza e a beleza, apesar de todo o sacrifício pelo qual vivia.

Luiza caminha até as pedras, senta e fica olhando o mar. Admira o sol nascer. Ela achava que estava só naquela praia. Não viu que um rapaz se aproximara, também para ver o sol raiar. Logo, o rapaz se aproximou da caiçara...

- Com licença, eu posso me sentar aqui?
- Pode sim. Tu vieste ver o sol também?
- Vim. Este lugar é mágico. É um paraíso na terra. Não imaginava que existia.
- Aqui é um paraíso sim. O sol nasce e nos brinda com o seu calor. Seus raios nos deixam com mais vida. O mar nos banha, nos dá alimento e sustento. Tu não és daqui?
- Não. Ah, muito prazer. Meu nome é Maurício. Estou passando uns dias na pousada, cheguei ontem à noite.
- Prazer é meu. Meu nome é Luiza. Eu moro aqui em São Miguel. Sempre vivi aqui. Cresci correndo na praia, subindo em árvore. Conheço todo mundo aqui neste lugar.
- Desculpe. Mas você não ficou com medo da minha abordagem?
- Não. Eu senti que você não viria me fazer mal algum. Que você é do bem.
- Obrigado. Que bom ter uma companhia para ver o dia nascer...
- Eu costumo vir aqui sozinha. Aqui eu converso com Deus. Eu olho para o céu e peço coisas boas. Eu sempre acordo cedo. Ajudo o meu pai a botar o barco no mar. Ele é pescador.
- Deve ser um paraíso viver aqui. Eu trocaria tudo na cidade para ficar aqui.
- Tu moras onde?
- Eu moro em São Paulo. Trabalho na área financeira. Vivo estressado e com a cabeça cheia de números. Tive um esgotamento físico e mental. Meu médico recomendou-me uns dias de licença. Vim para Santa Catarina por indicação dele. Especialmente para São Miguel. Ele conhece o vilarejo. Disse que aqui eu iria me encontrar.
- Se eu te fizer um convite, tu aceita?
- Qual é?
- Vamos tomar um banho de mar. O sol já está nascendo?
- Vamos.

Luiza e Maurício entram no mar. Tomam um banho de mar de roupa e tudo. Maurício sente a delícia da onda a bater em seu corpo. Luiza brinca como criança. Os dois jogam água um no outro, correm pela beira da praia. Se divertem como se fossem duas crianças. Depois, cansados, voltam e se sentam na beira do mar. Luiza e Maurício voltam a conversar:

- Luiza, você me fez sentir criança. Eu jamais imaginei que tomaria banho de mar de bermuda, camiseta, chinelos. Eu transgredi, eu fiz algo que jamais fiz.
- Maurício, que bom. É tão bom a gente se entregar ao novo, a novas emoções, sensações. Que bom, tu está bem?
- Eu estou ótimo. Bem, Luiza, obrigado pelo belo início de dia que me ofereceu. Eu acho que a gente se cruza de novo aqui na praia, não?
- Claro, eu moro aqui. Eu trabalho na pousada onde tu está hospedado. Hoje estou de folga, mas a gente volta a se ver.
- Luiza, obrigado, olha, um bom dia.
- Para ti também, Maurício.

Maurício volta para a pousada, toma um banho, lava a roupa para tirar o sal do mar e vai tomar o café da manhã. Volta para o quarto e vai dormir. Afinal, estava ali em São Miguel para descansar. Maurício dorme e em seu sonho, a fantasia se mistura a algo tão real. Maurício se vê um pescador, o qual prepara o barco para sair ao mar. Vai ao mar e, de repente, o tempo vira. Um temporal começa. As ondas ficam revoltas e ele e outros pescadores caem ao mar logo que o barco vira, após sucumbir a uma onda gigante.

Maurício vai ao fundo. Vê que não consegue voltar a superfície e começa a se afogar. Quando tem a nítida impressão que vai morrer, sente que perde as forças e se vê afundando. Em um passe de momento, algo mágico, sobrenatural, excepcional, é carregado pelos braços para a superfície. Assim que abre os olhos, vê aquela mulher o carregando para a praia. Ele foi salvo, ele teve sua vida estabelecida de volta. Aquela mulher, morena, sorria para ele. Sem entender, aquela mulher lhe deu um beijo nos lábios, passou a mão em seu rosto e voltou para o mar. Viu que ela tinha nadadeiras e o restante de seu tronco era de um peixe. Maurício foi salvo por uma sereia. Contrariando o que diz a lenda, a sereia não o carregou para sempre, mas o devolveu a vida. E a sereia tinha o rosto e os cabelos negros de Luiza. A caiçara da praia de São Miguel que ele havia conhecido no por do sol daquele dia que começava. Um dia o qual ele foi buscar descanso. Para aliviar o estresse e a loucura da vida conturbada que tinha na grande cidade.

Assustado, Maurício acorda daquele sonho. Vai para o banheiro da suíte, lava o rosto e fica a olhar para o espelho. Olha e vê novamente o rosto da morena. Vê Luiza na porta do pequeno aposento. Vê a morena a sorrir, a olhar para ele e dizer que havia voltado. Que havia ido até lá para ficar com ele. Loucamente, ele se atirou nos braços daquela mulher e a ela lhe entregou o seu ser. Novamente, assustado, abre os olhos e vê que não estava a amar ninguém entre aqueles lençóis. Começou a imaginar a sua loucura, a sua demência. A morena estava lhe tirando do sério. A morena fazia o corromper todos os seus sentidos, os mais loucos, os mais normais, os mais anormais. Maurício não conseguia controlar o que sentia. Havia perdido a sua postura e o seu controle sobre tudo. Estava envolvido por aquela mulher. Uma mulher diferente, uma mulher estranha a tudo o que conhecera. Foi para São Miguel para relaxar. Esquecer inclusive de Cinara. Sua ex-noiva, a qual ele teria rompido noivado dias antes após descobrir a sua traição. Cinara o traiu com Alexandre, seu primo e melhor amigo. Aquela infidelidade teria agravado o estresse emocional do rapaz, o qual completava dois anos trabalhando sem férias. Maurício trabalhara para comprar o apartamento e também mobiliar a casa a qual viveria com Cinara. Sua namorada desde os 18 anos. Maurício estava com 30 anos. Jovem, bonito, apaixonado por Cinara, a mulher que cravou uma faca em seu peito.

Maurício sai pela praia. Sai a procurar algum vestígio de Luiza. Queria novamente ver aquela mulher. Ver se era uma fantasia ou se sentiria algo novamente por ela. Se suas pernas ficariam trêmulas ao vê-la. Sai a caminhar pelo vilarejo e encontra Luiza. Ela caminha próximo a praça do lugar. Assim que a vê, vai cumprimentar a jovem:

- Luiza! Boa tarde!
- Boa tarde, Maurício. Como vai?
- Estou bem. Fui para a pousada tomar café, dormir um pouco. Você está ocupada?
- Não. Estava aproveitando o meu dia de folga. Estava caminhando um pouco por aqui. Vamos até o quiosque do Zé, é bem ali.

Os dois chegam no quiosque. Luiza pede uma cerveja bem gelada e uns camarões fritos. Os dois se pararam a conversar:

- Maurício, este lugar é inesquecível. Tu ficas aqui até quando?
- Eu vou embora no final da semana. Tenho que voltar para a minha rotina. Eu queria ficar aqui mais um pouco. Talvez volte nas minhas férias.
- Volta sim. Tu estás aqui para descansar...
- Sim. Eu estou me curando. Na alma, no corpo..
- Na alma... deixou um grande amor para trás.
- Não. Eu fui deixado por um grande amor.
- Mesmo?
- Sim. Eu estava com o casamento marcado para daqui há duas semanas. Descobri que minha noiva me traía com um primo meu. Meu sócio no escritório. Melhor amigo, frequentava minha casa. Para mim foi um golpe.
- É absurdo. Mas espero que tu fiques bem, que tu cures e que volte para cá logo.
- Eu quero voltar sim.
- Maurício, tu estás a fim de ir a uma festa comigo hoje à noite?
- Festa? Onde, aqui?
- Sim, vai ter uma roda de samba e música da praia. O pessoal que vai tocar é daqui mesmo. Os turistas geralmente vão e adoram. Quer ir?
- Eu vou sim.
- Tudo bem. Olha, a gente se encontra aqui na praça às oito da noite. A festa é aqui perto, tudo bem?
- Claro, por mim está bom.
- Maurício, o papo está ótimo, mas vou andar. Preciso passar em casa. Olha, a cerveja e o camarão é por minha conta. Tchau.

Luiza sai a andar de volta para casa. Se arruma, toma banho, coloca um vestido branco, com rendas, folgado e uma sandália rasteira de couro. Escovou bem os cabelos negros, lisos, escorridos e pôs um batom vermelho. Retocou as unhas com esmalte vermelho e se preparou para aquela noite festiva. Dona Maria lhe diz:

- Filha, tu estás uma boneca. Linda, bela, formosa. Aproveita a festa. Tudo isto é por que? Conheceu alguém. Tem homem novo na vila?
- Mãe estou me arrumando porque gosto. Ah sim, conheci um rapaz sim. Ele se chama Maurício. Ele mora em São Paulo e está passando uns dias aqui na vila. Ele é bonito, forte, formoso. Homem moreno, pele morena. Muito bonito sim. Eu o conheci na praia.
- Filha, cuidado com estes homens de fora. Cuidado para não te levar pra longe. Tu não podes sair de São Miguel. Aqui é o teu mundo. A tua aldeia, o teu povo...
- Mãe, eu tenho certeza que ele vai ficar aqui. Vai se encantar com São Miguel.
- Teu pai sabe que tu estás conhecendo um homem?
- Mamãe, eu nem estou namorando ainda. Só conheci. Não posso dizer nada, sabe.
- Bem, tu sabes que teu pai não quer te ver aí como uma rapariga na praia. Ele vai brigar contigo, minha filha.
- Mãe, fica tranquila. Eu sei o que estou fazendo. Eu não vou me deixar levar por homem forasteiro. Ele é bonito, mas eu pouco o conheço. Ele parece ser um homem decente, um homem direito.
- Que bom, minha filha. Vá para a festa e cuidado.

Maurício, já ansioso, aguardava a bela morena no banco da praça. Luiza aparece, bela e formosa, pronta para o levar para a festa. Antes, o convida para tomar uma cerveja no quiosque. Os dois vão.

- Luiza, você está linda. Posso te elogiar?
- Claro que pode, Maurício. Tu também está muito bonito. Gostei desta camisa pólo azul, combinando com o teu jeans. Estás elegante. Olha, vamos fazer um brinde. Tudo bem que o copo é de plástico, mas vale. Um brinde a noite.
- Claro, um brinde.

Luiza e Maurício vão para o samba. A festa está cheia. Tomam cerveja, dançam, dão risada e se divertem. Dançam juntinho, dançam separado. Aproveitam a noite mesmo. O grupo toca sem parar. Luiza conhece todo mundo da festa. Fala com um, fala com outro. Já tinha sido a garota São Miguel, disputou o concurso de a mais bela pescadora da região, ficou em segundo lugar. A morena bonita deixava Maurício louco, a perder de vista. A festa termina e ambos saem pelas ruas do vilarejo. O barulho do mar e o silêncio, apenas com o coachar dos sapos e das cigarras dá o tom da noite. Maurício resolve levar Luiza até a sua casa. Assim que chega, se despede da morena:

- Luiza, obrigado pela noite. Estava triste. Agora estou alegre.
- Maurício, não precisa agradecer não. Olha, tu queres vir aqui amanhã na hora do almoço?
- Você não vai trabalhar amanhã?
- Vou sim, mas só à tarde. Venha aqui amanhã na hora do almoço, venha almoçar com a gente, comer um peixe. Te apresento para a minha mãe, minhas irmãs, meu pai. Tu aceita?
- Aceito sim. Boa noite, Luiza.
- Boa noite, Maurício.

Os dois se despedem com um beijo no rosto, comportado. O dia amanhece e Maurício cedo acorda. Não consegue dormir. Se vê como um adolescente que descobre o primeiro amor. Há muito tempo não sentia aquela sensação em sua vida. Maurício estava morto no amor. Acomodado em uma relação. Jamais imaginara que poderia se interessar por alguém, em especial em uma viagem a Santa Catarina. Nada era programado naquela hora. Nem o que poderia descobrir.

Maurício chega a casa de Luiza e ela o vem receber na frente da casa. Ela o cumprimenta e o convida para entrar. O apresenta para seu pai, sua mãe e suas irmãs. Todos vão a mesa para comer. O peixe ensopado estava pronto. Era um dos últimos que ainda tinham em casa. Seu Silva iria para o mar no outro dia, para pescar peixe espada e outros da terra.

- Rapaz, tu pescas?
- Eu não pesco. Mas eu admiro a vida dos pescadores. Estão sempre em contato com o mar.
- Se eu te convidar para sair comigo amanhã pela manhã, assim que o dia estiver raiando para o mar, tu aceitas?
- Eu vou sim.
- Que bom, rapaz. Para entrar na família Silva tem que gostar de pescar.
- Papai, não deixe o Maurício encabulado. Não repare, papai é assim mesmo.
- Não estou encabulando não, filha. Se ele vai namorar contigo, eu tenho que saber se ele sabe pescar. Se não sabe, ensino. Vem comigo, rapaz. Vem comigo me ajudar a arrumar a rede.

Maurício prontamente foi junto com o senhor Silva para arrumar a rede para a pesca da manhã seguinte. Dona Maria chama Luiza para ajudar a tirar a mesa e lavar a louça do almoço.

- Minha filha, que rapaz bonito. Vi que teu pai gostou dele. Tem um comportamento diferente, refinado. Não é igual a estes caras daqui.
- Mamãe, vocês estão tratando ele como meu namorado. Eu ainda não disse nada. Nem sei se vou namorar com ele, sabe mamãe.
- Ah, mas teu pai não entende estas coisas de amizade. Ele acha que ele é o teu pretendente. Já o convidou para pescar com ele amanhã.

O dia segue, a noite vem e, na madrugada, Maurício chega na frente da casa dos Silva. Já está pronto para sair para o mar com o pai de Luiza e mais outros dois rapazes, Rodrigo e Renato, primos de Luiza e que também moram em São Miguel. Seu Silva apresenta o jovem paulista a eles e todos começam a arrumar a rede, as bóias, as iscas, tudo para ir para o mar. Vão para o atracadouro e saem com o barco, ainda com a noite fechada. Maurício coloca uma bermuda jeans, camiseta e chinelos. E sai junto com os pescadores. Queria sentir como era ser um pescador. Queria viver aquela emoção, aquele momento único.

Ajudou o seu Silva a jogar a rede. E ali o barco parou, ficou a deriva das ondas e também dos peixes. Seu Silva chegou a ele e disse:

- Hoje vai dar peixe e peixe bom. O vento está soprando do sul. Não está frio, mas o vento sopra, sabes. Logo esta rede vai estar cheia. Vamos voltar para a praia com peixes. Muitos peixes.

E a rede encheu, era peixe espada, siris, alguns camarões. Voltaram para o atracadouro. Levaram as cestas para pesar e, ao final do trabalho, seu Silva deu uns peixes para Maurício. Disse:

- Rapaz, tu levas jeito para a coisa. Vi como és calmo e como sabes ouvir o que os velhos te falam. Leva estes peixes para ti. Pede para a dona Conceição, lá da pousada, fazer para ti. Vais comer bem e lembrar da gente.

Maurício abraça o velho Silva, agradece:

- Nunca havia saído para pescar. Foi uma experiência única na minha vida. Obrigado seu Silva. O senhor me fez lembrar meu avô. Lembrei de minha infância, quando saia para o campo com meu avô. Ouvia os seus ensinamentos. Tenho muita saudade dele.
- Rapaz, gostei de ti. Quando é que tu vais embora?
- Eu vou daqui há três dias. Espero voltar aqui em breve. Este lugar mexeu muito comigo.
- Eu sei que tu vais voltar. E não vais mais sair de São Miguel. Aqui está a tua vida. Aqui está o teu futuro, tua família. Um dia tu vais me entender, rapaz.
- Por que o senhor diz isto?
- Porque está escrito no céu. Tu vieste para cá para reescrever a tua vida. Reescrever a tua história. Começar tudo de novo. Este mundo não é o teu. Aquele que tu vens também não é o teu.

Maurício vai para a pousada, sem entender nada. Chega no quarto, toma um banho e vai se deitar um pouco. Antes, passa na cozinha e deixa para a dona Conceição os peixes que ganhou. A pousada estava vazia, só tinham três hóspedes. Um deles era Maurício.
O rapaz fecha os olhos e se põe a sonhar. Se vê de mãos dadas com Luiza, correndo na beira da praia. Os dois corriam em direção a uma pequena criança. Uma linda menina que vinha ao encontro dos dois. Ambos abraçavam a criança e se punham a rodar e a brincar. Um sorriso nos lábios. E aquela cena fez Maurício acordar. Sem imaginar o que acontecia com ele e com sua cabeça.

Luiza vai até a pousada para trabalhar. Ali, encontra Maurício sentado em uma sala, olhando para o horizonte. Ela o vê e o cumprimenta:

- Maurício, tudo bem contigo? Tu gostou de sair para pescar com meu pai?
- Gostei sim. Eu fiquei muito emocionado com o que vivi. Sabe, Luiza, meu pai morreu quando ainda era criança. Tenho apenas minha mãe e meu irmão. Senti muito quando meu avô também morreu. Ele foi uma referência de pai a qual tive para a vida. Quando sai com teu pai para o mar eu senti uma forte lembrança. Eu lembrei de meu avô. Lembrei de quando saia com ele para o campo. Ele tinha uma chácara no interior e eu passava as minhas férias lá. Tirava leite da vaca, ia para o campo ajudá-lo a plantar, colher. Era uma vida maravilhosa. Assim foi a minha infância e juventude.
- Meu pai também disse que gostou de ti. Disse que tu és aplicado e que o ajudou no manuseio da rede. Meus primos também gostaram de ti. Que bom que nós pudemos te dar estes momentos alegres.
- Luiza, eu quero te dizer algo...
- Diga..
- Eu estou sofrendo muito por ter que ir embora.
- Tu já vais depois de amanhã.
- Mas eu quero voltar, eu quero ficar aqui. Depende de algo..
- Depende de quê, Maurício?
- De você me dar sim. De você aceitar ser minha namorada. Desde aquele dia em que tomamos banho de mar, desde sempre eu não consigo parar de pensar em você. Você mexeu com minha cabeça, com meus sentimentos... eu não sei o que faço. Eu estou apaixonado por você, Luiza.
- Maurício, eu quero dizer que também penso em ti. Me arrumei para ir ao samba pensando em ti. Te convidei para ir a minha casa porque também imaginava que poderia, quem sabe, me aproximar de ti. Te namorar, entende?
- É claro que te entendo. Luiza, eu estou te amando..
- Eu também, Maurício.

Um longo beijo sela aquela declaração de amor. Ambos começam a se abraçar e a se beijar. Luiza esquece o trabalho e se põe a abraçar o rapaz, ali mesmo, naquela sala. O dono da pousada havia saído e os dois estavam ali. Um longo beijo e um longo abraço começavam a marcar aquele momento, o qual seria de grande e profundo amor.

Luiza terminou o seu expediente e os dois foram caminhar na praia. De mãos dadas. Os curiosos do vilarejo, que conheciam a morena, observavam e cochichavam sobre o belo casal. Os dias correm e Maurício precisa voltar a São Paulo. Antes de partir, vai até a casa de Luiza e conversa com seu pai:

- Seu Silva, eu preciso conversar com o senhor.
- Já sei. Vai pedir a mão de minha morena em casamento?
- Eu quero pedir a mão dela em namoro. O senhor permite?
- Claro que sim. Eu gostei de ti, rapaz. Vi que tu és um homem sério, direito, decente. Tu vais embora amanhã para São Paulo?
- Infelizmente vou. Mas eu não sei o que faço de minha vida.
- Vou te dar um conselho, meu filho. Vá até lá, decide a tua vida e volta.
- Voltar? O senhor diz para mim voltar?
- Claro que sim. Tu podes voltar sim. Eu arrumo uma casa para ti ficar.
- Eu não estou entendendo nada. Absolutamente nada.
- Não é para entender, rapaz. É para viver. Aqui em São Miguel a gente procura não entender, mas sim viver.

É chegada a hora da partida. Luiza vai até o ônibus que leva os viajantes até Florianópolis. Ali se despede de Maurício:

- Meu amor, promete que volta? Não vais deixar o meu coração partido...
- Luiza, eu vou a São Paulo para resolver a minha vida. Eu não posso mais ficar longe de ti.
- Meu amor, me liga quando chegar..
- Ligo sim. Eu volto. Em breve eu volto.

Os dois se despedem com beijos e abraços e o ônibus parte. Vai subindo o morro e a vista para o mar e as montanhas é de tirar o fôlego. Estava realmente saindo do paraíso. Maurício olha para o vilarejo e para os barcos parados e se põe a chorar. Um choro baixo, em silêncio. Maurício sentia que algo tinha mudado sua vida. Sentia que seu coração e sua alma tinham ficado em São Miguel. Via em sua frente o olhar cândido e amável daquela morena. Via Luiza vestida de branco, vestida de noiva, via Luiza grávida de seu filho, via ao lado seu Silva, dona Maria, as pequenas Letícia e Rebeca, via aquela família como também sendo sua. Via que voltava para São Paulo. Para uma vida a qual não era mais sua. Voltava para a relação fria e gélida com sua mãe. Uma mulher depressiva, que tomava medicamentos, que era infeliz em um novo casamento, via que nada mais em sua vida tinha a importância a qual devia. Tinha que resolver o que fazer com o apartamento, o qual comprou e pagou tudo sozinho.

Assim que chega a São Paulo vai para sua casa. Chegando, conversa com Ricardo, seu irmão mais novo.

- Ricardo, eu resolvi algo em minha vida..
- Fala, mano. O que você resolveu?
- Eu vou voltar para Santa Catarina. Eu conheci alguém lá. Conheci uma linda morena. Ela se chama Luiza. Começamos a namorar e eu vou embora para lá viver com ela.
- Você está maluco mesmo! Mulher de praia a gente pega, dorme e deu. Amor de praia não sobe a serra. Já esqueceu isto, Maurício?
- Não, Ricardo. Com esta foi diferente. Eu a vejo casando comigo, vejo a grávida, tendo filhos. Morando em uma casa naquele vilarejo. São Miguel mudou a minha cabeça. O amor da minha vida está lá. Eu não quero mais esta vida.
- Maurício, acho que você está maluco. Cara, você vai largar tudo isto, este vidão, a nossa vida e vai morar na beira de uma praia, com uma mulher morena, de lá, nativa. Eu acho que você está maluco. Mas, meu irmão, a vida é sua. Vá mesmo. Seja feliz. E me manda o endereço que eu vou lá nas férias te visitar.
- Como eu conto para a mamãe sobre isto?
- Ela vai ficar maluca contigo. Imagina. E o apartamento?
- Vou botar a venda. Pego o dinheiro e compro uma casa e um carro lá em Santa Catarina.

É chegada a hora de conversar com Margarida. Tinha que contar a sua mãe o que ia fazer de sua vida:

- Mamãe, eu posso conversar com a senhora?
- Pode sim, filho. Como foi a viagem? Descansou a cabeça?
- Sim, mamãe. Mas não foi só isto?
- Você se meteu em alguma confusão.
- Não. Melhor. Eu conheci uma pessoa em Santa Catarina. Eu estou envolvido, apaixonado. O nome dela é Luiza. Mora em São Miguel.
- Você está louco! Desatinado! Sai para descansar a cabeça, termina com Cinara um namoro de anos e agora diz que acabou conhecendo uma moça de beira de praia.. você enlouqueceu. Só falta me dizer que vai embora para Santa Catarina. Aí eu vou ter é um ataque.
- Mamãe, eu vou embora morar lá em São Miguel.
- Seu louco! Você enlouqueceu! E as suas responsabilidades, e o escritório com seu primo Alexandre, e as responsabilidades. Você acabou de comprar o apartamento que queria, mobiliou, vai fazer o quê, com tudo o que investiu? Largar tudo para aventurar... vai viver do quê em Santa Catarina?
- Mamãe, eu quero viver ao lado dela. Eu estou apaixonado. Mamãe, eu não vou abrir mão deste amor.
- Traga esta moça para cá então. A transforme em uma moça da sociedade. Se precisar eu ajudo a torná-la gente. Aposto que deve andar de chinelos, cabelo bagunçado por causa da praia, deve cheirar a peixe. Eu odeio peixe, detesto praia.
- Mamãe, você sempre quis controlar a minha vida. Sempre fui o que a senhor quis que eu fosse. Fiz tudo, me formei, fiz especializações, viajei para o exterior, quase casei com Cinara. Só não casei porque descobri o que ela e teu querido sobrinho Alexandre me fizeram. E a senhora quer que continue infeliz?
- Maurício. Definitivamente. Se você quer fazer burrada na sua vida, que faça. Eu não vou te apoiar em nada. Não vou lá, não quero saber destas coisas. Você enlouqueceu. Tudo o que fiz, como mãe foi te ajudar, te encaminhar na vida, para que você fosse um grande homem. Agora, se você quer largar tudo para ir embora viver uma aventura, faça. Você é um homem. Sem juízo, mas tem 30 anos. Não vou ser eu que vou impedir de fazer burradas. Mas sabe, se ficar sem nada, não venha bater em minha porta para me pedir dinheiro. Acabei de separar de teu padrasto por conta disto. Fazer colocar a minha fortuna fora. Eu não vou dar dinheiro algum para esta tua loucura.
- Mamãe, muito obrigado pelo seu apoio. Fique com o Ricardo e com o dinheiro. Eu vou embora ser feliz.
- Vá, vá sim. Faça como o sonhador do teu pai. Bote as coisas fora. Vá viver de vento, comer areia de praia em Santa Catarina.

Maurício bate a porta e sai. Procura um amigo corretor e vão até o apartamento. Ambos acertam o negócio. Maurício também vai em uma loja de carros e deixa seu carro para vender. Em questão de uma semana, por milagre, consegue vender o apartamento e o carro. Assim que fecha o negócio, liga para Luiza, em Santa Catarina.

- Luiza!
- Amor, eu estava com saudade. Como estão as coisas aí em São Paulo? Tu voltas ou não voltas mais?
- Luiza, meu amor. Estou chegando aí na semana que vem. Consegui resolver a minha vida. Já comprei a passagem. Embarco para aí no domingo.
- Amor, amor. Vem mesmo. Vem, estou te esperando. Hoje é quinta-feira. No domingo vou te esperar em Florianópolis. Peço uma carona para o senhor Vicente, ele sempre leva a gente de carro quando se precisa de algo na capital.
- Luiza. Te amo.
- Eu também te amo, Maurício.

O domingo chega e Maurício vai para o aeroporto. Acompanhado de Ricardo, se despede do irmão:
- Meu irmão, obrigado por me trazer. Obrigado por tudo. Deixo esta vida para trás, começo uma nova vida em Santa Catarina. Lá está a mulher que amo. Lá está a minha vida. Vou morar em São Miguel. Assim que conseguir uma casa eu te mando o endereço.
- Mano, vai com Deus. Cara, seja feliz lá. Viva o teu sonho. Maurício, não fique com raiva da mamãe não. Ela é assim mesmo. Ela vai esfriar a cabeça e tenho certeza que ela vai te visitar também.
- Adeus, Ricardo. Te espero no Natal.
- Claro, mano. Eu vou lá passar o Natal contigo. Se a mamãe não quiser ir, problema é dela. Ela que vá passar as festas com aquela gente chata da família. Eu vou para Santa Catarina este ano.

Maurício embarca no voo. Pouco mais de uma hora o separam de seu destino final. Uma viagem tranquila e a chegada a Florianópolis para uma nova vida. Assim que desce, vê Luiza o aguardando. Chega e corre para os braços da amada. Um longo beijo marca aquele reencontro. Ambos saem, abraçados, em direção a um táxi. Vão para a rodoviária e tomam o primeiro ônibus para São Miguel. Viajam abraçados, como dois adolescentes. Trocam olhares e carícias. Olham para a janela do ônibus e vêem o sol forte e a estrada costeando o mar. São Miguel fica na ponta de uma bela península. Uma aldeia pequena, um vilarejo pequeno com menos de quatro mil moradores. Uma pequena cidade litorânea, o lugar escolhido para Maurício transformar a sua vida. Maurício que foi a São Paulo, pediu demissão e desfez a sociedade com seu primo, por meio de advogado, vendeu o apartamento o qual moraria com sua ex-noiva, Cinara, e vendera o seu automóvel importado. Aplicou o dinheiro em fundos de investimento e o restante em uma poupança, para comprar uma casa e um barco, assim recomeçar a vida em São Miguel, ao lado de sua amada Luíza.

A viagem termina e eles voltam para São Miguel. Maurício fica hospedado na pousada por uns dias. Assim que larga a mala vai para a casa de Luiza para almoçar com os Silva. Todos os esperavam, com uma peixada, com frutos do mar. Aquele dia seria de festa, de uma intensa festa. Seu Silva recebe o jovem:

- Eu disse que tu voltava, meu rapaz, que tu irias voltar para cá. Aqui era o teu lugar. Aqui tu vais ser feliz. Fazer tua família ao lado de minha filha.
- Seu Silva. Eu nunca poderia imaginar que iria mudar tanto a minha vida. Não podia imaginar que iria voltar para cá, ficar nesta cidade, comprar uma casa. Deixar tudo o que tinha em São Paulo e embarcar nesta história.
- Meu rapaz, é a história do amor. Do amor que apareceu pra ti, na tua vida. Aqui tu estás na tua casa. Saiba que gostamos de ti. Vimos que tu és um rapaz bom. Sei que tua família vai entender e em um futuro vai te apoiar também.
- O senhor é vidente?
- Não, meu filho. Eu sei o que é o amor. Eu também não era daqui. Eu venho de outra região do mar. Eu vim de Portugal. Da Ilha da Madeira. Aqui cheguei e conheci a Maria. A Maria é da terra. Fiquei apaixonado pela morena. Isto faz mais de 40 anos. Hoje estou aqui. Também deixei uma vida para trás e aqui fiquei, por causa de um grande amor. Hoje tu largas tudo na grande cidade e vem para cá, por causa de um amor. Tu vais ser feliz aqui, rapaz. Podes acreditar. É o amor que te trouxe.
- Incrível a sua história.
- Bem, vá para a pousada descansar um pouco. Vá pegar uma praia com Luiza. Vão namorar. Amanhã a gente sai cedo para ver uma casa para ti. Eu já falei com o senhor Braga. Ele vai ver uma casa boa para ti, aqui pertinho da nossa. A Maria e a Luiza te ajudam a mobiliar a casa. Depois a gente trata do casamento.

Tudo tão rápido, tão rápido mesmo. Maurício e seu Silva encontraram uma boa casa. Uma casa bem arejada, com dois quartos, sala, cozinha, banheiro, área de serviço, garagem e um espaço para a saida de um barco. Maurício foi até o banco, em Florianópolis, para sacar o dinheiro e comprou o imóvel. Rapidamente, Maria e Luiza começaram a mobiliar a casa e a preparar o enxoval para o casamento. Maurício comprou as alianças e os dois ficaram noivos. Mais um mês se passou e ambos casaram. Fizeram o casamento em uma igreja evangélica do vilarejo. Ricardo veio de São Paulo para acompanhar o casamento do irmão. A cerimônia, cercada de amor, marcou aquele momento sublime, um amor que nascia na beira do mar e que se fortalecia diante do altar, com as bênçãos de Deus. Também casaram no civil no mesmo dia e depois fizeram uma festa, regada a peixes, camarões e doces. As bordadeiras da vila presentearam a noiva com lençóis, colchas e cortinas, tudo feito com renda da terra.

Depois da festa, Maurício e Luiza foram para a casa. Já era noite, pois os noivos resolveram aproveitar a festa junto com amigos e com a família. Os corpos se entregaram a momentos de amor profundo. Intimidade e paixão, desejo, afeto, o que era de mais nobre e mais sublime marcou a primeira noite do casal. O dia amanhece e os noivos vão tomar um banho na praia. A praia estava deserta e ambos resolveram tomar banho nus no mar.

Brincaram, pularam e se entregaram a momentos de beijos e abraços. A casa branca, de janelas grandes e com um alpendre ficava na frente da praia, a poucos metros da casa dos Silva. Ali nascia uma nova família, os Silva Teixeira. Passam se as semanas e Luiza começa a ficar tonta, a sentir enjôos. Era o aviso que um fruto daquele amor divino estava chegando. Luiza estava grávida de Maurício. Uma gravidez comemorada pela família. Uma gravidez desejada, mesmo que ainda cedo, com pouco tempo de casamento. Nove meses passaram e nascia a pequena Mariana. Veio ao mundo uma linda menina. Forte, uma bela criança. Um lindo bebê para selar aquele momento de amor.

Maurício fez um curso de corretor de imóveis e se dedicou ao ramo imobiliário. Junto com Luiza abriram uma imobiliária e compraram dois barcos, os quais colocaram para passeios em alto mar. Maurício também aprendeu a pescar e saia com o sogro para o mar. Quando chegava o inverno, no tempo da tainha, voltavam do mar com a rede cheia do peixe. Faziam tainha assada, ova frita, arroz, pirão d´água, banana frita. E assim viviam, comendo e comendo. A criança fazia a festa dos Silva, enchia o coração dos pais de alegria. Maurício e Luiza tiveram mais um filho. Outra menina. Se chamou Rita. Os anos passaram e a vida continuou naquele vilarejo. Maurício era um homem feliz, realizado. Apaixonado por Luiza e por suas amadas filhas, por Mariana e Rita, mal sabia que a morena voltara a enjoar de novo. Mais uma menina veio ao mundo. E se chamou Cláudia.

Três meninas. três barcos, duas casas. Assim a vida daquele rapaz, que chegara a São Miguel para esquecer uma desilusão, uma amarga desilusão, se transformara para um sempre. Luiza, também apaixonada pelo marido, encontrou nele a realização de seus sonhos. Do sonho de trabalhar em algo próprio, de voltar a estudar e terminar o ensino médio, de ter filhos, de ser uma mulher realizada e uma mãe também feliz com suas filhas.

Nunca poderia imaginar que seu amor seria escrito à beira mar. Mas à beira mar, o vento, o sol e as ondas do mar selaram o que seria, para sempre, a felicidade.

OSCAR HENRIQUE MARQUES CARDOSO, outubro de 2011

NEGO

Nego
quero te convidar para uma kizomba
uma alaúza
uma bagunça
um fuzuê
sei lá o quê

Lá tem pacoça
lá na choça
onde todo mundo dança
se embalança

Nego
quero te chamar para comer canjica
pipoca
massaroca
sei lá

Cocada, amendoim
feijoada, pamonha
fubá
ah
e tomar guaraná

Nego
quero te convidar para dançar
pagodear
rebolar
brincar
te largar

Nego
quero o teu balanço
porque eu danço
a cantiga da ginga
da gíria
da cobiça
da brincadeira
da leseira
da besteira

Nego
eu quero ser feliz
porque nesta vida
eu sou um aprendiz

UMA FLOR

Digo que vi uma flor
em meu caminho
perto do ninho
que criei
que desenhei
que projetei

A flor era tu
Rosa
Margarida
Hortênsia
A flor era tu
ali
junto de mim

Eu plantei uma flor
no jardim do amor
onde não tem dor
lá não há rancor

Eu criei uma flor
não é imaginação
ali está
para sempre
junto do meu corção

COMO VIVERIA...

Como achei que viveria
em transe
em suspensão
em atração
em superação

Como achei que viveria
sem teu calor
sem teu amor
sem teu ardor

Como achei que viveria
sem luz
sem magia
sem alegria
a qual irradia
para todo o meu ser


Como achei que viveria
sem te encontrar
sem te perdoar
sem te idolatrar
sem te amar

Como achei que viveria
não poderia
não deveria
não saberia

Como achei que viveria
sem magia
sem ironia
sem poesia

sábado, 29 de outubro de 2011

MEU CORPO

Pensei em ver o meu corpo
por detrás daquela imagem

Tudo me embaralhava
Me enlouquecia
Me excitava

Uma loucura
Translúcida
Absurda
Aberrante
Excitante

Meu corpo
Minha carne
Minha alma
Me acalma

No silêncio de um olhar
Estou a mirar
Ao léu a vagar

Meu corpo
Meu tudo
Meu absurdo
Somente
meu corpo

SEM DESATINO

Sem desatino
Eu me pego

Eu me achego
Eu me renego
Eu me nego

O tempo todo
O todo o tempo

Pare tudo
Deixe o meu desatino
Levar o meu destino
A um lugar impoludo
A um externo absurdo

Me dê carinho
Me dê vazão
Eu quero perdão
Necessito de paixão
Ver pulsar o meu coração

domingo, 29 de maio de 2011

FLORIANOPOLIS

F elicidade
L eveza
O olhar
R esplandecer
I maginação
A mor
N ascimento
O rganizar
P aixão
O cultar
L etra
I ndiscutível
S abedoria

OSCAR HENRIQUE MARQUES CARDOSO

PAULO

P aixão por acreditar
A mar é um verbo a sempre conjugar
U ma vez não, amar é sempre assim
L etra de uma canção sem fim
O rgulho por ter um coração que bate com amor



OSCAR HENRIQUE MARQUES CARDOSO

CANOAS, COM RIMA E COM AMOR

Chegando assim de tranco
parei no Rio Branco
Ah, como a saudade dói
Falta que me faz, Niterói

A vida é uma alegria
Assim és tu, Harmonia

Junto as mãos
a ti com fé e raça
Nossa Senhora das Graças

Assim a cidade me encara
Ao passar pelo Igara

Canoas do meu caminhar
Canoas do meu cantar
Da Mathias
Do Guajuviras
Da Estância Velha
Do São Luiz

Canoas, assim eu sou
feliz e feliz

OSCAR HENRIQUE MARQUES CARDOSO

MORENA DO RIBEIRÃO

Foi na beira da praia
no ribeirão
que vi
a minha paixão

Morena afinada
alinhada
de saia
rodada
bordada
ligeira
morena faceira

Ali eu me perdi
Não me vi
Não me senti

Não sei
se viverei
sem te olhar
olhar para teus olhos
morena faceira
rendeira
morena do ribeirão
de boca vermelha
de sorriso
de paixão

Assim que puder
quando o céu couber
eu pego uma estrela
a que passa em cima do ribeirão
e com a minha mão
trago pro coração
morena do ribeirão
mulher
cheia de paixão

OSCAR HENRIQUE MARQUES CARDOSO

quarta-feira, 25 de maio de 2011

DIVERSIDADE

É verdade
É realidade
É equidade
É a maturidade
De uma sociedade

Ser plural
Ser real
Ser igual
Ser racional
Amplamente
Ser cultural

Negro
Branco
Índio
Cafuso
Mameluco
No Brasil
Tem claro
Tem branco
Tem escuro

Mas o racismo é absurdo
É doença
É avareza
É pobreza

Diversidade
É amar
É respeitar
É considerar
É sentir
Refletir
Agir
Ouvir
Não reprimir

Diversidade
É amar
É respeitar
Com muita
Com plena
Com a máxima
Verdade

OSCAR HENRIQUE MARQUES CARDOSO

terça-feira, 24 de maio de 2011

SECSO

S ei que não posso mais viver sem ti
E scuto o teu falar, todos os dias assim que acordo
C aminho em busca de um local para estar contigo
S atisfaço o meu desejo diário em olhar para tua foto
O olho e admiro o amor que sinto por ti, o desejo, o tesão, o coração

SECSO


OSCAR HENRIQUE MARQUES CARDOSO

PORNO

P orque eu não consigo te entender
O uço o que tu me dizes
R eflito no que tu esperas de mim
N ada me faz esquecer o teu olhar, o teu beijo, o teu cheiro, o teu ar
O lho para ti e meu coração pulsa, feliz e feliz

PORNO



OSCAR HENRIQUE MARQUES CARDOSO

segunda-feira, 23 de maio de 2011

MALHADO, ESTE VOCÊ PODE CONFIAR

Em toda a rua de subúrbio, não tenho a certeza de todas porque não saí para contar, mas creio que em boa parte, há uma calçada estreita, carros antigos estacionados, casas com janelas pequenas e um cachorro, ou uma cachorrada latindo ou correndo atrás de alguma cadela no cio. Naquela rua onde morei, cresci, briguei, namorei, casei, tive meus filhos e de lá parti para outras paragens havia uma casa rosa. Amplas janelas denunciavam que ali moravam pessoas muito especiais. Uma delas era a dona Geni. Viúva de um policial civil, ex-delegado do bairro, dona Geni criou seus filhos – duas mulheres e um homem e hoje prepara deliciosos doces para esperar os seus quatro netos. Todo o domingo é assim. Aquela casa rosa, naquela rua de Ramos, no Rio de Janeiro, ganha um brilho ainda mais especial. O aroma frugal e doce que sai das panelinhas da cozinha de Dona Geni são os mais sensacionais. São sabores incríveis e também os mais apaixonantes. Porque a dona Geni é apaixonada por seus netos. Ela ama a vida. Dona Geni conta com duas proteções de peso: Jesus Cristo e o seu inseparável e fiel escudeiro: o Malhado.

É um cachorro digamos... nobre, único em sua espécie. Não que pertença a raça dos malhadus grandis peludis não, porque esta raça não existe. Malhado é um velho vira lata, branco, com manchas marrons no pelo e com um enorme rabo. Quando o rabo do Malhado balança, prepare-se: pode ser um gesto de carinho ou então um rompante de proteção a sua idosa e amada dona. Malhado não cuida só da casa de Dona Geni. Tem livre acesso ao pátio e ao corredor de casas de uma senhora também muito especial.
Dona Rosinha é vizinha de dona Geni. Também viúva, mora em uma casa ampla, com janelas azuis e parede branca. A casa de dona Rosinha é a primeira da pequena vila de casas onde fica situada. São inquilinos da dona Rosinha, o barbeiro Horácio, um senhor sexagenário, cearense, que mora com a costureira Raimunda. Raimunda tem as mãos de ouro. A primeira calça de linho feita por ela... a gente nunca esquece. Maria do Carmo, diarista, também mora num pequeno cômodo, com o bêbado e chato marido, o desempregado Osvaldo. O Osvaldo, este é uma “mala sem alça”. Quando não está bêbado, está de mau humor. Nem o mais belo dia de sol do Rio de Janeiro consegue fazer com que ele dê um sorriso. Acho que nem no dia em que seu filho, Pedro, nasceu, este homem não deu sorriso algum. Haja purgante e reza braba pra curar a chatice do Osvaldo. Maria do Carmo é mulher de fé. Não perde nenhum culto da Igreja Universal, principalmente as correntes. Ela tem uma fé inabalável. Fé que ajudou a curar Pedro de uma forte pneumonia quando criança. Pedro hoje é militar, é casado e não mora no Rio de Janeiro. Mora no Rio Grande do Sul. Maria do Carmo conta com o carinho de Geni, Rosinha e também dos vizinhos. Todos já disseram a ela para se separar de Osvaldo. Mas ela disse que o dia de ele sair de sua vida está chegando e que Deus fará a obra. Será? Acho que o caso de Osvaldo será difícil de resolver.

A semana passou. Choveu, fez calor, fez frio, deu praia, deu arrastão, deu ressaca. Assim é o Rio, acontece tudo ao mesmo tempo, principalmente no clima. Era domingo. O bairro ainda acordava. Simples, alegre, as ruas se enfeitavam, era um dia alegre no subúrbio. Era dia de pegar o trem na Leopoldina para comer churrasco na casa dos parentes, curtir um pagode no pé sujo da esquina, ver o jogo do Flamengo com amigos e, é claro, acompanhado de uma loira gelada. Na zona sul é bom, mas no subúrbio também é bom. Domingo no subúrbio é assim. Dona Geni acordou cedo, abriu a janela do quarto, olhou para o céu, viu o sol. Abriu a porta da cozinha e lá viu o Malhado, deitadinho, ainda acordando, pronto para mais um domingo de cuidados e de afagos pela vizinhança. O Malhado tinha até página de fãs no Orkut. O Malhado era conhecido por toda a rua. Era um cachorro amigo, um cão que protegia a todos. Acho que em sua morte, deveriam mudar o nome da rua. Batiza-la de Rua Malhado. Era o melhor nome que poderia se dar ao logradouro.

Dona Rosinha passou e chamou dona Geni no portão:

- Geni, vamos à igreja! Tá na hora, minha amiga!

Dona Geni, chega na janela e pede para Rosinha aguardar:

- Rosinha, estou dando comida para os pássaros e também o leite pro Malhado. Eu já vou com você. Me espere um pouquinho.

A amável Rosinha esperou e, sorrindo, deu um bom-dia para Maria do Carmo, que também saía de casa.

- Maria do Carmo, que cara é essa? Você não dormiu à noite?

Com os olhos marejados, a vizinha lhe respondeu:

- Não dona Geni. Osvaldo saiu ontem de casa e até agora não voltou. Tenho medo. Vou para o culto orar. Tenho medo que ele me mate.

Assustada, Rosinha lhe disse:

- Sangue de Jesus tem poder! Este louco não vai fazer isso. No mínimo ele foi para a Vila Mimosa e por lá se meteu com algum rabo-de-saia. Aliás, rabo não, com mulher sem saia mesmo. É um homem sem respeito. Larga este traste minha amiga!

Neste tempo, dona Geni chega e vê as duas conversando. Ela se aproxima e fala com Maria do Carmo:

- Minha querida Maria, o que houve? O que foi que o Osvaldo te fez? Dormiu fora de casa de novo?

Maria do Carmo confirma:

- Dormiu sim. Ele dormiu fora. Estou preocupada. Estou com medo que aconteça algo com ele e comigo também. É um homem muito doido. Está possuído pelo demônio.

Geni responde:

- Está possuído e perdido. Deixa este homem ir embora. Ele não te ama e também não te respeita. Você é uma mulher nova, bonita. Larga dele e vai pro Sul morar com o teu filho. Ele e a mulher dele são pessoas boas e vão te acolher na casa deles. Deixa este velho imundo ficar embaixo da ponte.

Com fé, Maria do Carmo sintetiza:

- Só Deus é que pode me separar deste homem. Também não o amo mais como marido. Mas eu não posso o largar. Só Jesus pode me salvar.

Conversando, as três amigas vão para a igreja. Maria do Carmo vai ao culto da Igreja Universal em Bonsucesso. É domingo de Santa Ceia. Geni e Rosinha vão até a igreja do bairro. Vão rezar para Santa Rita. Geni já deixou o doce de leite pronto e esfriando no tacho, deixou os legumes cortados e lavados para fazer um ensopado e também temperou, ainda no sábado à noite, o frango para servir com arroz e macarrão para a filha Alessandra, que vai lhe visitar com o Marido, Ricardo, e os netos, Thiago e Francisco. As crianças levam alegria a casa de dona Geni, e Malhado fica balançando o rabinho quando sabe que eles vão chegar.

A missa acabou e o culto também. Por coincidência, as três amigas se encontraram na parada de ônibus, próximo a rua onde moram. Ao voltarem juntas para as suas casas, ambas conversam:

- Maria do Carmo, será que Osvaldo já chegou em casa?

- Não sei dona Geni. Acho que sim. Deve estar deitado na cama, só de cuecas e bêbado, como sempre. Assim são os meus domingos, tristes, muito tristes.

- Menina, vá lá pra casa almoçar comigo. Hoje meus meninos não vão lá em casa me ver. Foram para Cabo Frio passar o final de semana com meu irmão que mora lá. Vou fazer um arroz com camarão. Vai almoçar comigo...

- Não sei dona Rosinha. Não posso deixar o Osvaldo sem comida não, disse Maria do Carmo.

Dona Geni entra em casa. Malhado, que está deitado no pátio, dá alguns latidos e balança o rabo. É sinal que algo aconteceu, ou vai acontecer. Dona Geni acarinha a cabeça do animal, abana para as amigas e entra em casa. Afinal, está quase na hora do almoço de domingo começar. Malhado sai da casa de dona Geni e acompanha dona Rosinha e Maria do Carmo até o pátio da morada. Dona Geni também acaricia a cabeça do animal e dá sorrisos. Maria do Carmo também gosta de Malhado. E brinca também com o cachorro. Malhado abre a boca, parece que está sorrindo e gostando da companhia de suas amigas. Ele balança o rabo e acompanha as duas.

Passado pouco mais do meio-dia, Alessandra e Ricardo chegam até a casa rosada de Dona Geni. São recebidos por Malhado, que late e pula no casal. Eles também saúdam o cachorro e as crianças já saem do Fiat Marea de Ricardo pulando e chamando pelo Malhado. Malhado brinca, joga bolinha com as crianças e assim vai o domingo. Um domingo de paz, um domingo de amor, um domingo de alegria. Alegria... até o final da tarde, quando uma grande confusão estoura no pátio de dona Geni.

Eram pouco mais de seis horas da tarde, quando uma gritaria veio do pátio de dona Rosinha. Nervosos, seu Horácio e dona Raimunda colocaram a cara para fora da porta. Da última casa da vila, vinham choros e gritos. Era algo fora do normal. Maria do Carmo gritava, pedia socorro, chorava e clamava a Jesus para salva-la. Eram copos quebrando, xícaras voando, coisas caindo no chão. Osvaldo berrava com a mulher. Eram gritos ilegíveis, misturados com palavrões. Parecia que o Diabo estava morando naquela casa. Dona Rosinha, assustada foi ao telefone e chamou a polícia. Enquanto a polícia não chegava, a vizinhança começava a se acumular na porta da casa da simpática moradora de Ramos. O futebol deu lugar àquela confusão. Era um fuzuê mesmo, com tudo o que tinha direito.

Alessandra ficou com as crianças em casa, para protege-las. Podia ser bala perdida, assalto, qualquer coisa. Afinal de contas, o Rio está violento sim. Ricardo saiu da casa e dona Geni, curiosa foi também para o meio da rua, tentar entender o que acontecia no pátio da casa da vizinha. Malhado arregalou os olhos, levantou as orelhas e abanou o rabo. Era hora de entrar em ação. O tumulto saiu do pátio e ganhou a calçada. Maria do Carmo saiu correndo de dentro do cômodo onde morava. E Osvaldo, com os olhos vermelhos e mais parecendo louco, sem camisa e de bermuda, com uma sacola numa das mãos, sai com uma faca em punho, para atacar a pobre e cristã Maria do Carmo. Envergonhada com aquele fisaco, Maria do Carmo sai correndo e vai em direção aos vizinhos. É um alvoroço só. Osvaldo, o louco, bêbado, e outras coisas piores, sai do pátio. Antes, olha para dona Rosinha, levanta a faca e diz:

- Eu vou voltar aqui. Vou acabar com a senhora, sua velha maldita. Antes, eu vou sangrar esta mulher. Vou sangrar e vou fugir. Polícia e ninguém vem atrás de mim. Se vir, eu me mato, eu corto os meus pulsos e vou culpar a vocês! Grita o enlouquecido Osvaldo.

Dona Rosinha, num ato de valentia, no alto dos seus 75 anos, olha para o homem e diz:

- Vai maldito! Vai embora, infeliz. Ninguém te quer aqui. Tu não mata ninguém, porque quem ameaça não faz. Ô meu Deus, obrigado por não fazer o teu filho ver esta tua baixaria. Ele não está aqui e eu vou ligar pro Sul e contar pra ele o que você ta fazendo com a mãe dele. Bandido! Sai daqui!

Maria do Carmo grita assustada:

- Osvaldo, vai embora daqui. Osvaldo, um dia eu te amei, te conheci, tivemos o nosso filho. Ele cresceu, é um homem de bem, tem família. Agora você é velho. É um velho ruim. Jesus, me salva. Osvaldo, te perdôo, mas te peço. Não me mata! Vai embora, vai pra tua bebida, vai pras tuas vagabundas. Me deixa em paz! Jesus cuida de mim. Jesus vai me ajudar ...e eu vou embora morar com o meu filho, em Porto Alegre. Jesus, Jesus, me salva....

Foi neste dramático momento em que Osvaldo, que estava sendo contido pelo seu Horácio e por Ricardo, marido de Alessandra, filha de dona Geni, conseguiu se desvencilhar dos dois homens. Com uma força descomunal, ele partiu para cima de Maria do Carmo e, com a faca apontada para ela, e com uma sacola na outra mão, pegou a mulher de tantos anos e lutas pelos cabelos. Um grito e um choro fino marcou aquele momento. Maria do Carmo achou que ia morrer ali, no meio da rua, defronte aos vizinhos de mais de duas décadas.

Num ato de heroísmo, o Malhado, aquele cão branco com pintas marrons no pelo, deu um salto. A pontaria foi certeira. O animal pegou o braço esquerdo, onde o louco do Osvaldo conduzia a faca. Osvaldo, com raiva, pegou a sacola e começou a bater no cachorro. O cachorro rusnava e também olhava firmemente para o homem que o agredia também. Foi uma luta espantosa. Ninguém esperava ver aquela cena. Nem as idosas vizinhas, nem Maria do Carmo, que perdeu um pouco de cabelo ao se desvencilhar das mãos do marido agressor e nem o restante da rua, que via o Malhado como um cachorro tranqüilo.

Osvaldo, com o braço sangrando, largou a faca no chão. Ainda tentou desferir um golpe no cachorro, mas não conseguiu. Malhado deu o golpe perfeito. Uma patrulhinha entrou na rua, com a sirene ligada, tentando afastar a multidão da cena. Osvaldo, rápido e rasteiro, saiu correndo para o lado inverso ao do carro da polícia. Saiu com a sacola um pouco rasgada no braço e com o sangue pingando. As crianças da rua saíram correndo atrás dele, jogando pedras e o xingando. Chamavam-o de bandido, de batedor de mulher, de covarde, de tudo quanto eram ofensas. Naquela hora, as crianças fizeram a catarse que toda a rua queria fazer. O negócio era jogar pedra no Osvaldo. O agressor fez sinal para um táxi que passava na rua próxima dali , embarcou no veículo e sumiu.

Maria do Carmo foi trazida para o portão de dona Geni. Todos a acolheram. Nervosa, a mulher tomou um copo de água com açúcar e o policial militar que estava na patrulhinha convidou-a a lhe acompanhar até a delegacia do bairro para prestar ocorrência. Fora uma tentativa de homicídio, seguida de ameaça. Dona Rosinha, que não quis saber de confusão, não foi a polícia. Dona Geni, os netos, Alessandra, Ricardo, e toda a vizinhança, ficaram surpresos com um gesto inesperado.

Jamais esperavam que o Malhado, aquele cachorro velho, gordo e branquinho, iria ter um ato como aquele. Assim que Maria do Carmo entrou na viatura policial, acompanhada de dona Raimunda e seu Horácio, Malhado deu um latido e também entrou na viatura policial.

Como um último ato de bravura, de heroísmo, de fibra e de virtude, o cachorro foi à frente da viatura, em uma janela, com as patas cruzadas no vidro e latindo. Malhado quis ir até a delegacia acompanhar Maria do Carmo. Ele sim quis ser testemunha e também apontar a responsabilidade criminal de Osvaldo. Todos riram. Osvaldo não voltou mais para Ramos. Para onde foi? Nem Jesus Cristo não quer saber dele. Nem nós.

O pequeno Thiago, neto de Dona Geni, resumiu o fato com uma pequena frase:

- Malhado, este você pode confiar..............

UM TIRO DERRUBA UM HERÓI

A notícia vem e vem trágica no noticiário do rádio: "Tiroteio e morte no Tuiuti. Três mortos e dez feridos em uma troca de tiros com a polícia".

Águida estava em casa, terminando de fazer uma costura. Já havia passado o café para esperar seu filho, Cícero, chegar de mais um dia de trabalho. Cícero era policial militar. Era lotado na região de Madureira, mas frequentemente era chamado para cobrir ações policiais em outras regiões da zona norte da cidade. Não eram poucas as vezes que Cícero cortava a Avenida Brasil ou a Linha Vermelha em alta velocidade. O combate ao crime no Rio de Janeiro tinha se intensificado. A ordem era deixar a cidade limpa, limpa da ação do crime organizado. Tudo para o Rio de Janeiro sediar a Copa do Mundo, a começar pela Copa das Confederações. O Rio de Janeiro tinha que estar limpo e perfeito para 2014.

Aquela notícia, transmitida pela rádio tocou no coração de Águida. Mãe experiente, viúva de policial militar, o qual não morreu em combate, mas morreu de velhice, com um infarto que o levou ao hospital e que em consequência lhe trouxe uma grave insuficiência cardíaca, a qual seu amor, Manoel, não durara por longo tempo, sabia o que era ficar com o coração em alerta a cada notícia de tiroteio ou de ação policial. Sempre soube que ser mãe de policial e esposa de policial militar não seria um destino dos mais tranquilos. Mas tinha muito medo por Cícero. Cícero era o filho caçula. Suas duas irmãs eram casadas. Nenhuma com homens de farda. Águida temia pela vida do filho, noivo de Suzana. Com casamento marcado para breve. Em suas orações, em sua conversa íntima com o Criador, pedia proteção aos passos do filho. Jovem de muita bravura, herói desde pequeno. Ao ver o pai fardado, Cícero já havia traçado, com palavras, seu caminho: ser policial militar como seu pai.

O aperto no coração da mulher velha persistia. Viúva, tinha medo que seu filho morresse nas mãos dos bandidos. Sonhava com o filho sendo alvejado em combate. Nunca queria sonhar, mas a imagem de seu filho morto em combate, tendo sua carne exposta e dilacerada na rua era algo que a atormentava. Sabendo de todo o seu temor, Águida jamais dissera ao filho para desistir do sonho de ser policial militar, e honrar a farda azul marinho, com a miniatura da bandeira do Estado do Rio de Janeiro costurada nas mangas do uniforme. Águida sentia um frio lhe percorrer a espinha. Sai do quarto e vai até a televisão. Liga e vê uma cobertura. Um helicóptero sobrevoava a região do Tuiuti e o repórter falava de mais uma tragédia cotidiana. Ali, um policial militar, um morador da área e um traficante foram alvejados e mortos na guerra entre traficantes e a Polícia Militar. O nome do soldado ferido no combate, o qual fora levado para o Hospital Salgado Filho, no Méier, também na Zona Norte, não havia ainda sido divulgado.

Águida foi até o telefone, pegou o caderninho com os números e ligou para o batalhão onde o filho era lotado. Lá, perguntou ao atendente se ele tinha informações acerca de um confronto que ocorrera entre policiais e traficantes no Tuiuti. O policial ainda não tinha informações. Não soube precisar o que acontecia.

Águida desliga o telefone e vai até a porta de casa. Alguém bate.

A mulher então recebe a notícia de um soldado. Era o soldado Vieira, amigo e colega de seu filho. Está acompanhado de outro soldado, soldado Ramos. Os dois entram na casa e pedem para conversar com a mulher.

Ambos dão a notícia que Cícero fora baleado. Que estava ferido e que havia sido levado ao Hospital Salgado Filho. Águida, nervosa, respira fundo, vai até o quarto, pega sua bolsa, pega o terço que está pendurado ao lado de sua cama, a fotografia com a imagem da Escrava Anastácia e sai. Segue acompanhada pelos policiais para o hospital, também na zona norte da cidade. No percurso, um profundo silêncio toma conta de todos que estão na viatura. O giroflex está ligado, mas a sirene não ecoa o pedido de passagem de emergência pelas avenidas. O trânsito está pesado para o horário. Não que o trânsito da zona norte carioca fôsse tão calmo. Mas naquele dia o caos parecia estar um pouco maior.

Os três chegam ao hospital, entram, se identificam na entrada de emergência. Um enfermeiro acompanha Águida até a porta do bloco cirúrgico. Seu filho, Cícero, se encontrava passando por procedimento cirúrgico. Era para extrair dois projéteis que estavam em seu corpo, além de estancar uma hemorragia interna. Foram tiros dados por fuzis. As chances de Cícero sobreviver aos ferimentos são pequenas. Os ferimentos perfuraram a aorta e Cícero corria risco de morte.

A cirurgia não terminava. Águida ligara para sua única filha que vivia no Rio de Janeiro. Alessandra chega ao hospital com Maurício, seu esposo. Águida chama Clara, sua irmã, solteira, madrinha de Cícero, que o criara e que fora alguém importante em sua vida, desde a morte de seu marido, Manoel.

A cirurgia chega ao final. Os médicos saem do bloco cirúrgico e, no final do corredor, chama os familiares de Cícero dos Santos. Doutor Aguiar, cirurgião experiente, da emergência, especialista em atender a feridos por arma de fogo e arma branca, se aproxima da família e diz: sinto informar, mas Cícero faleceu durante a cirurgia. Meus sentimentos a todos. Fizemos o que fora possível, mas não conseguimos estancar a hemorragia. Ele teve uma parada cardiorrespiratória e não conseguimos o reanimar. Pergunto a vocês se Cícero era doador de órgãos. Vocês concordam com a doação?

Águida se abraça em Alessandra e ali também Clara se abraça a Maurício e todos começam a chorar. Os colegas de farda, Vieira e Ramos, também choram. Choram copiosamente. Choram com dor e revolta a morte do amigo e colega, tão jovem e que se fora em combate. Suzana, a noiva, também chega ao hospital. Se abraça a Águida e chora copiosamente. A jovem desmaia e é socorrida. Tragicamente ficara viúva, às vésperas de casar. Viúva e com o filho do casal no ventre, pois estava com três meses de gravidez, fruto do amor e da paixão que tinha por Cícero.

Os familiares autorizam a doação de órgãos e os médicos decidem manter as funções vitais vivas por mais seis horas, até que realmente possam fazer a retirada dos órgãos do policial militar.

Morto em combate, mais um herói que entrava para as estatísticas da violência no Rio de Janeiro. Um tiro, certeiro na aorta, derrubou um herói. Desde pequeno, Cícero queria ser herói. Sonhava em ser herói. Primeiro, como todo o menino, ser bombeiro. Depois, policial. E na Polícia Militar o jovem começara a realizar o seu desejo, seguindo os passos de seu pai. Manoel se reformou capitão, morreu doente. Mas deu sua vida e sua bravura também no combate e na defesa da criminalidade, em favor ao Rio de Janeiro. Cidade a qual amava. Chegado da Paraíba, de Campina Grande. Fora no Rio de Janeiro que Manoel casou com Águida, carioca do interior do estado, com quem tivera seus três filhos: Alessandra, Aline e Cícero. Fora no Rio de Janeiro, em Madureira, onde vivia, que tivera sua casa, que tivera seu lar e o mesmo batalhão, onde serviu até se reformar. Foi ali, com casualidade ou destino que Cícero também servira.

Dois tiros de fuzil pararam a carreira promissora de Cícero dos Santos. Seu corpo fora levado a Igreja Evangélica da Paz, onde a família congregara. Depois, para o Jardim da Saudade, em Sulacap, onde também fora enterrado. Sepultado com honras militares.

Na despedida, Águida, mãe, mulher, viúva, órfã do varão que lhe sobrara, colocara sobre o caixão uma foto de Manoel, pai do jovem, homem o qual amou e respeitou durante toda uma vida. E que se separara pela viuvez a qual lhe atingira. Águida coloca a foto do marido sobre o caixão do filho e começa a cantar. Começa a cantar uma música a qual seu filho gostava muito. Cantara uma canção cristã, uma música a qual falara de vida eterna, a qual falara de uma morada eterna. Uma morada junto a Jesus, o qual está sentado a direita de Deus, em um trono sagrado, junto ao paraíso.

Alessandra, seu marido Maurício, Suzana e Clara jogaram flores no túmulo. Aline, irmã de Cícero não conseguiu chegar a tempo para o enterro do irmão. Morava em Londres e soube da morte por um primo de Cícero. Estaria vindo ao Brasil em breve, mas de lá ficara triste e demolida emocionalmente com a morte do irmão que tanto amara.

O bandido que matou Cícero também morreu na troca de tiros. Foi alvejado por policiais.

Cícero se foi. Partiu jovem, morreu aos 29 anos. Às vésperas de seu casamento, às vésperas de ser pai de seu primeiro rebento. Tomba um filho bom, bom noivo, bom irmão, bom policial, bom homem de bem. Tomba mais um brasileiro que deu a sua vida para combater a violência urbana.

Um tiro derruba um herói.

VIDA CORRIDA E FELICIDADE PELO VIVER

Corro e corro. Todo o dia é a mesma agonia. Acordo antes do sol raiar. Pego a marmita com a comida quentinha, feita pela Maria. Coloco na bolsa, tomo uns goles de café, ainda saboroso, mesmo na garrafa térmica. Saio ligeiro e vou até o ponto do ônibus.

Ali, outros esperam o primeiro da manhã. O ônibus deixa o bairro em direção a outro ponto da cidade, bem perto da estação do trem. Deixo o coletivo e caminho, atravesso a passarela e entro na estação. O trem já vem lotado. Embarco no vagão. Sacudindo e lotado vou para o trabalho. Desço em uma parte do percurso e nem troco de plataforma. No mesmo espaço, pego outro trem, que me leva para a zona oeste. Saio do extremo sul e vou para o leste, do leste pego a ligação para o oeste. Desço na estação do oeste e tomo um ônibus. O dia já clareou, o sol tímido começa a aparecer e as nuvens já o encobrem.

Mais de duas horas depois de ter saído de casa, sem dar o beijo nos filhos, sem ouvir o latido do cachorro e apenas me despedir da Maria com um beijo na testa, chego ao trabalho. Vou pro vestiário, coloco o uniforme e vou para a oficina. O dia está puxado mesmo. O sinal bate. Meio dia. Almoço a comida da Maria. Arroz, feijão, bife, ovo frito, salada de tomate. Como uma banana de sobremesa e bebo um gole de café para ajudar a baixar a comida para o bucho.

O dia termina, volto pra casa. Tomo o primeiro ônibus. Chego na estação do oeste, tomo um trem, vai até o ponto leste. No leste eu desço e pego outro trem, para a zona sul. Na zona sul, tomo um ônibus de volta para onde moro. Mais duas horas para voltar para casa. Chego no lar. Todos assistem TV. As crianças, de banho tomado e limpinhas me abraçam. É o primeiro beijo do dia, já à noite. Maria está limpando a cozinha, pois já está com o jantar prontinho. Feijão novo, arroz quentinho, os bifes empanados também prontos, a salada de tomate e cebola.

A gente se senta à mesa, a gente reza, a gente agradece. Todos comem. Todos se olham, todos sorriem. Somos uma família feliz e abençoada. Meus filhos vem, me mostram os cadernos, me contam as novidades da vida. Do seu dia. O meu pequeno fala dos gols que fez na hora do recreio. Maria me fala da visita que fez a casa de minha mãe e do café com bolo de fubá que comeu por lá.

Eu sou feliz pelo que tenho. Trabalho de segunda à sexta-feira. No sábado, vou dar uma volta, jogo bola com os amigos. No domingo, passeio com a famíla. Vamos para o parque, para o shopping, para a casa dos avós. As crianças adoram. O cachorro também faz festa. Todos somos muito felizes.

E na segunda-feira, ainda antes do sol nascer, volta a correria.

Vida corrida, vida enlouquecida

Eu corro e corro e corro...

domingo, 22 de maio de 2011

MEU DIÁRIO DE MULHER DA CASA, DO LAR, DIÁRIO DA MULHER DO ZÉ

Dependente de mim, meu marido, José Antônio me pede tudo. Eu tenho que ser mulher de cama e de mesa. Pior, quando vou ao centro da cidade ele me pede para comprar meias e cuecas. Não são meias e cuecas claras que pede. Pede cuecas vendidas naqueles potinhos redondos, bem baratos mesmo. Não gosta de roupas íntimas caras. As meias, pede os pares vendidos pelos ambulantes. Não gosta de roupa íntima refinada. Também me pede para passar no mercado central e comprar rabada. Ele adora comer rabada com agrião. Mas a rabada tem que ser do jeito que faço, com muita pimenta e agrião.

Dependente de mim, José Antônio é assim. Eu tenho que acordar cedo, passar manteiga no pão, fazer o café com leite, o pão tem que ser novo, antes mesmo de o padeiro disponibilizar os pães na padaria. Eu tenho que levar o primeiro lote do pão fresquinho para casa.

José Antônio é um bom marido. Trabalhador, honesto, tem um escritório no centro da cidade. Homem de costumes simples. Bom marido, bom tudo. Na cama, faz o papai e mamãe bem feito, bem direitinho. Homem católico, devoto de Nossa Senhora. Gosta de tomar o mate quando chega em casa. Me dá atenção. É bom pai, preocupado com nossos três filhos. Sonha em ser avô. Meu filho mais velho, Ricardo, casou. Casou com Patrícia e ainda não tiveram filhos. Mas Ricardo sonha em dar um neto homem para nós. Um neto gremista, de preferência.

Nos finais de semana, o de sempre. No sábado, faço feijoada. No domingo, churrasco. O Zé vai pra churrasqueira, assa costela. Todos comem. Carne, salada verde, maionese, arroz, aipim cozido. Se sobrar um pouco da feijoada do sábado, não tem problema, vai para a mesa também. O feijão é aquecido na panela de ferro, no fogão à lenha que tenho ao lado da churrasqueira.

Minha vida é feliz. Sou uma mulher feliz. Fui criada para casar. Para ser dona de casa, para ter filhos. Para ser mãe. Mãe católica, mãe dona de casa. Mãe que visita também a sua mãe, que troca receitas de bolo, aprende a costurar melhor para acertar a bainha das calças do Zé e dos meninos. Também aprendo com minha mãe receitas caseiras para tirar manchas de roupas, para matar baratas e insetos. Também cuido do Faísca, o cusco que temos aqui em casa. O Faísca é o parceiro de todo mundo. Cuida do pátio e dá as suas saidinhas pelo bairro às vezes. Não sei se o Faísca me deu netos. Se virão aqui cadelas com sua prole latir a minha porta para cobrar pensão para o meu cachorro. Esta é ótima.

No verão, o programa é o de sempre. Vamos para a nossa casa de praia. Lá eu cozinho, lavo, passo, descanso um pouco, quando dá. Os meninos e o Zé vão, levam familiares, amigos. Nossa casa é sempre cheia. De dia, café da manhã bem tarde, praia, churrasco na hora do almoço. À noite, pego o casaquinho e vamos pro centrinho da praia, todos, para comer cheesburguer, tomar refrigerante e sentar na praça para ouvir a música que toca no alto falante.

Minhas amigas me convidam para tomar chá. Eu vou, ajudo no chá das senhoras. Participo do clube de mães. Às vezes converso na internet com elas. Também telefono e nós trocamos receitas de comida e também de como fazer artesanato para ajudar na renda de casa. Pinto panos de prato. Vendo e o dinheiro dos panos de prato eu também compro minha lingerie. Compro camisolas, compro calcinhas e sutiãs. Sutiãs que cobrem o bojo dos meus seios familiares. Dos seios que amamentaram os meus três meninos. Meus seios que nunca pecaram e que nunca deixaram o Zé abusar.

Sou uma mulher feliz, realizada. Tive meus filhos. Fui criada para casar, para ser mãe e esposa. Lavar, passar, cozinhar, criar os filhos e deitar com o Zé. Meu primeiro e único homem. Único que beijei na boca. Casei. Deus me livre beijar na boca um homem o qual não fosse meu marido.

Mas sou feliz. Nunca pensei em imoralidades. Nunca pensei em coisas, fantasias. Nada que saísse do controle. Mas sou feliz como sou.

É um pouco do diário da minha vida. Eu sou a mulher do Zé. Sou mãe desta família, todos precisam de mim. Todos dependem de mim. Não sei o que seria da minha vida se não tivesse a minha família, meus filhos, minha casa, meus bichos, minhas plantas, minhas coisinhas.

Sou feliz.

VENTO

Vento
lento
intenso

Vento
beija meu rosto
mexe meus cabelos
sacode meu corpo

Vento
frio
rodopio
corropio

Assopra
dói
enfeza
embeleza

Amortece
enobrece
entontece
escurece
acontece
aparece

Vento....

OSCAR HENRIQUE MARQUES CARDOSO

NOSSA SENHORA

Nossa Senhora
virgem
coração de mãe
pureza
beleza

Nossa Senhora
me abençõa
me cuida
me ampara
me declara
teu filho
unigênito

Nossa Senhora
cuida de mim
do meu coração
me dá colo
me dá perdão

Nossa Senhora
figura cândida
pureza
beleza

OSCAR HENRIQUE MARQUES CARDOSO

TESÃO

Tesão
palavrão
esquemão
corpão
peitão
bocão
mulherão
homenzão

Tesão
olhar
cheirar
desejar
beijar
tocar
acarinhar

Tesão
palavrão
pudor
sexo
pecado
perdão

Tesão
paixão
emoção
coração

Tesão
palavra
paixão

OSCAR HENRIQUE MARQUES CARDOSO

ESTRANHA LOUCURA

É estranha a minha loucura
Eu tento te esquecer
Mas não consigo
Eu tento te amar
Mas não me permito
Eu tento te idolatrar
Mas não aceito
Não tem jeito
Não tem meio
Não tem início
Não tem começo
Não tem fim

A minha loucura é assim
Um misto de não
Um misto de sim
Um pouco de estou a fim
Um pedaço de está tri

É assim a minha estranha loucura
É assim a minha nova forma de ser
De viver
De te ter
De me ter

É assim a minha estranha loucura
A loucura estranha
Estranha loucura a
Viver
Reviver
Viver

OSCAR HENRIQUE MARQUES CARDOSO

quarta-feira, 18 de maio de 2011

VOCÊ NASCEU

Um milagre eu pude ter
Eu pude ver
Eu pude crer

Um milagre eu vivi
Foi assim que senti

Quando tu nasceu
Quando tu viveu
Quando senti o teu respirar

Pude agradecer
E saber
Que assim tu nasceu

Eu peço licença
Com reverência
Com irreverência
Para adentrar
Para falar
Para cantar
Para entoar

O agradecimento

Por ti
Por mim
Por nós
Por vós
Agradecer
Pois tu nasceu

OSCAR HENRIQUE MARQUES CARDOSO
My first love
My big love
My prayer
To you

I´m so very happy
Because
You loves me

Because
I love you
I agree
I need you
I need me
I need us

LIBERTAÇÃO E AMOR

Tu, ó Senhor
Me curaste
Me libertaste
Me desamarraste
Da cilada da morte
Com sorte
Com fé
Com crença
Com renascença
Eu sobrevivi
Eu venci
Eu vivo
Eu creio
Eu estou aqui
Sempre junto a ti
Para te adorar
Para te respeitar
Para te desejar
Para te amar

OSCAR HENRIQUE MARQUES CARDOSO

JESUS, PARA SEMPRE JESUS

Jesus,
Que morreu em uma cruz
Mas que sofreu
Renasceu
Hoje vive
Reluz
Conduz
Me leva ao amor eterno
A vida verdadeira
A paz
A união
A comunhão

Senhor Jesus
Abençoa o meu Brasil
De terras varonil
De um povo servil
De um povo que te ama
Ama em doação
Ama no coração

OSCAR HENRIQUE MARQUES CARDOSO

segunda-feira, 16 de maio de 2011

GENTE INFLÁVEL

Gente inflável
Cuidado, inflamável
Chega de peito siliconado
Bunda siliconada
Xoxota recauchutada
Pinto de borracha

Chega de tanta beleza
Chega de tanta dureza
Chega de querer bancar a realeza

Eu quero ser Deus
igual aos meus
igual aos plebeus
Eu quero ser normal

Normal
Alto astral
Etecétera e tal

Chega de inflável
Chega de ser inflamável

Eu quero ser feliz
Quero te amar
Quero me amar
Te adorar
Me adorar

Ser feliz com o que tenho
Ser igual a ti, ao meio

Ser assim
Chega de ser inflável
Quero ser inflamável
Alegria injetável
Em meu coração
Eu teu coração


OSCAR HENRIQUE MARQUES CARDOSO

sábado, 14 de maio de 2011

ATRÁS DA PORTA

Quando olhaste bem nos olhos meus
E o teu olhar era de adeus, juro que não acreditei
Eu te estranhei, me debrucei Sobre o teu corpo e duvidei
E me arrastei, e te arranhei
E me agarrei nos teus cabelos
No teu peito, teu pijama
Nos teus pés, ao pé da cama
Sem carinho, sem coberta
No tapete atrás da porta
Reclamei baixinho
Dei prá maldizer o nosso lar
Pra sujar teu nome, te humilhar
E me vingar a qualquer preço
Te adorando pelo avesso
Pra mostrar que ainda sou tua
Até provar que ainda sou tua.

BELÍSSIMA E EMOCIONANTE CANÇÃO, INTEPRETADA POR ELIS REGINA

TALISMÃ

Sabe, quanto tempo eu não te vejo.
Cada vez você mais longe, mais eu gosto de você.
Porque.... sabe, eu pensei que fosse fácil
Esquecer seu jeito frágil
De se dar sem receber
Só você...
Só você que me ilumina, meu pequeno talismã
Como é doce essa rotina de te amar toda manhã
Nos momentos mais difíceis você é o meu divã
Nosso amor não tem segredo, sabe tudo de nós dois...
E joga fora os nossos medos
Vai saudade diz pra ela, diz pra ela aparecer...
Vai saudade ve se troca
A minha solidão por ela pra valer o meu viver.

CANÇÃO DE ELSON DO FORROGODE

JOSÉ

José
E agora, José?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
e agora, você?
você que é sem nome,
que zomba dos outros,
você que faz versos,
que ama, protesta?
e agora, José?

Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio,
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José?

E agora, José?
Sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio – e agora?

Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais.
José, e agora?

Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você cansasse,
se você morresse...
Mas você não morre,
você é duro, José!

Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja a galope,
você marcha, José!
José, para onde?

CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE

TU ME DESTES E ME DÁS O TEU AMOR

Jamais serei amargurado
Jamais direi agruras
Em meu peito
Bate alegrias
Bate vidas
Bate o amor que recebi

Eu recebi de ti
Eu ganhei de ti
Eu me dei para mim

Assim, meu bem
Meu vintém

Eu me entrego
Eu deito
Eu rolo
No teu olhar
No teu falar
No teu cantar

E apaixonado estou
Apaixonado ficarei
Apaixonado me tornei

Me perdi em teu olhar
Em tua boca, deixei passar
As palavras de paixão
Os versos de tesão
Palavras de fogo
Gestos de imaginação

Eu quero explodir
Eu quero implodir
Eu quero me redimir
E jamais te perder
Jamais esquecer

Do minuto
do segundo
do milésimo
do centésimo
do teu amor
do teu amor sem fim
do meu amor por ti

OSCAR HENRIQUE MARQUES CARDOSO

VOLTANDO PRO MEU CHÃO

Eu preparo o meu coração
para partir
deixar para trás
a vida que deixei

Os amigos que fiz
Aqueles que quis
E não fiz

Mudo de cidade
Mudo de história
Transformo a trajetória

E parto
De volta pro meu chão
Pro meu quinhão
Pra junto do meu ribeirão

Com amor eu vivi
A vida eu servi

Aqui me reencontrei
Aqui eu me achei
Para sempre, viverei

OSCAR HENRIQUE MARQUES CARDOSO

O FIM DO COMEÇO

Acordei naquela manhã com um gosto amargo. Não era de fel em minha boca. Era o gosto amargo de conversar, de falar contigo sobre a nossa despedida. Me doeu demais saber que tudo começou de uma forma tão linda, mas terminou. Terminou como um frasco de soro que chega ao seu final, pingando as derradeiras gotas de energia para um corpo doente e acomedido de intensa fadiga. Mas tive que ser forte. Pular da cama, tomar o banho, me vestir, preparar o café e, solitário, me alimentar. O dia estava só começando.

Tirei o carro da garagem e fui para o trabalho. Torcendo para não te encontrar naquele espaço. Teria que demonstrar que meu dia seria realmente um sucesso e que começaria a manhã de forma bem animada. Afinal, entrava no ar às 10 horas da manhã, pontualmente. Sabia que iria te encontrar, mas não queria te encontrar.

Nove horas, vou para o camarim. Troco a minha roupa, vou para a maquiagem dar os últimos retoques, para tirar as olheiras da noite que não dormi, mas que pensei em ti e que imaginei te ter ali, a meu lado.

Tu finalmente chega, com a cara mais cansada ainda. Mais triste e desabada. Deves ter dormido na casa de teus pais, ou então ligou para a primeira amiga de plantão e foi desabafar. Ficou a noite inteira conversando, chorando, colocando todas as mágoas para fora.

Chegas, me dá um simples e doído "oi". Troca a roupa, coloca um traje especial, o qual te deixa mais linda do que de costume. Muda o penteado e segue também para o estúdio.

Lá, apresentamos mais uma edição do programa da manhã. Recebemos entrevistados, mas o sorriso amarelo não nos deixa desfarçar que estamos tristes, arrasados. Fora o fim de tudo. Graças ao correr do tempo, o programa acaba e chega a hora do almoço. Você vem e me chama para almoçar. Educadamente, eu aceito o convite. Você entra no meu carro e vamos.

Fomos para o restaurante que gostávamos de ir, na beira da praia. Ali as ondas batem suavemente. Batem fracamente, suaves e a brisa nos embala, assim como as gaivotas vem para comer os frutos do mar e pedacinhos de conchas, na areia.

Pedimos um vinho branco e comemos um delicioso haddock. Estava dos deuses aquele prato, com um sabor todo especial. Você então pede para ir até a nossa casa, aquela que foi a sua casa, para apanhar algumas roupas e joias. Diz estar ficando na casa de teus pais. Eu aceito te levar até lá, afinal, também ajudaste a pagar aquela casa, trabalhamos muito para isto. Fizemos muitos trabalhos, viajamos, fizemos bicos, tudo para levantar aquela casa, naquele terreno na rua deserta, onde ninguém imaginara se seria incluida em um condomínio fechado. Hoje aquela casa vale muito. Mais vale com a tua presença.

Chegando lá, vai até o quarto. Eu acabo indo junto e você vai direto a cama. Me olha, abre o vestido, ficas em minha frente só de lingerie. Eu também, te olhando, hipnotizado, me livro rapidamente das minhas vestes. Beijos, abraços e carinhos. Começamos a nos entregar de novo. Eu não queria me entregar a ti, de maneira nenhuma. E também sei que tu não querias te entregar a mim, mas aconteceu.

E foi maravilhoso. Fomos ao céu e caminhamos com as estrelas

Você não foi mais embora. Ficou. Tomamos banho em nossa piscina. Ficou, ficamos, juntos, unidos e para sempre. Eu perdoei a tua traição, tu perdoou a minha. Vivemos felizes e ficamos felizes, para sempre, até quando tivesse que ser.

EU ACREDITO

Eu acredito no céu
Eu acredito na lua
Eu acredito no teu beijo
Na tua boca crua
Na tua pele nua

Eu acredito no teu cheiro
No teu jeito
Peculiar de me ter

Eu acredito
Que tu me quer
Que tu quer ser minha mulher

Eu acredito no teu amar
Eu quero gozar
Eu quero me aprofundar
Eu acredito
Eu não minto
Eu sempre sinto
O teu pulsar
Eu acredito
Eu quero te amar

DOR...

Não há dor pior
que o desamor
que ouvir o não
ouvir a rejeição
aturar a solidão
sem poder dizer não

Não há tristeza assim
Dor sem fim
Corta-me como estopim

De uma saudade
da eternidade
da dura verdade

Um antídoto me alivia
Me contagia
Me possui
Me inclui
No veneno que pode ser lento
Intenso
Um só lamento

Uma poção me acalma
Faz me esquecer
De te ver
De sentir
De ter
Dor...

AMIGO

Amigo
a gente guarda
a gente ressalta
a gente realça

Amigo me eleva
Amigo me entende
Me compreende

Amigo, tu me encanta
Tu me abrilhanta

Amigo,sei que tu me ama
Saiba, amigo
Te amo
Sempre te amarei
No eterno, viverei

quinta-feira, 12 de maio de 2011

EU CANTO PARA UM DEUS

Eu canto para um DEUS que não é branco
Não é de palha
Não é de sonho

Eu canto para um DEUS
Que é o meu encanto
Meu acalanto

Eu canto para um DEUS
Que não é de pedra
Não é de barro
Não é de pó
Não está na poeira

Eu canto para um DEUS
Que não diz besteira
Que não tem leseira
Que não me dá rasteira

Eu canto para um DEUS
Que me ama
Que me encanta
Que me contagia
Que me irradia
A junto amar
E para sempre, caminhar

OSCAR HENRIQUE MARQUES CARDOSO

EU PEDI PARA ME DAR A VOCÊ

Eu pedi para nascer
Eu pedi para crescer
Eu pedi para mamar no teu peito
Eu pedi para te ter respeito
Eu pedi para viver

Quanto te vi
Pedi para te ter
Em meus braços
No calor dos meus abraços

Eu nasci
Porque tu vivias
Eu cresci
Porque tu crescias
Eu não morri
Pois tu não morrias

Se eu pudesse
Se eu quissesse
Se eu entendesse
Se eu compreendesse
A alquimia do amor
Com furor
Entregaria minha alma a ti
Com intenso sabor

OSCAR HENRIQUE MARQUES CARDOSO

quarta-feira, 11 de maio de 2011

APOIO EM CANOAS


Agradeço o apoio do vereador Cebola, do PT, de Canoas. Apoio por ofertar o espaço para o lançamento de NÓS em Canoas. Aviso aos amigos e seguidores que estarei na Feira do Livro de Canoas, RS, no dia 6 de junho, onde estarei fazendo o lançamento do NÓS a partir das 19h, na FEIRA DO LIVRO DE CANOAS, na Praça da Matriz. Todos estão convidados.

Acompanhem os detalhes e passos de minha carreira literária pelas redes sociais e também pelo blog OSCAR HENRIQUE, ESCRITOR

PRODUÇÕES MINHAS, LITERATURA EM 2011




MEUS LIVROS, MINHA PRODUÇÃO LITERÁRIA PARA 2011

LIVRO LANÇADO, NÓS, lançado pela Editora Biblioteca 24 Horas. Estamos em fase de lançamentos. Já foram realizados lançamentos nas cidades de Caxias do Sul, Canoas, Santa Maria. Agora o próximo lançamento será Porto Alegre, na próxima quinta-feira, dia 19 de maio, a partir das 19 horas no Memorial do Rio Grande do Sul. Logo após, lançamento também em Florianópolis, no dia 29 de maio, na UFSC.

ENTRE LOUVORES E AMORES, primeiro livro destinado ao público cristão e também ao público em geral. Uma livre adaptação de uma passagem bíblica, a qual fala da Profecia contra a casa de Eli. Romance, com 500 páginas. Será dividido em dois volumes e lançado, ainda em junho, pela Editora Naós.

VIDA DE MULHER, segundo livro destinado ao público cristão e não cristão. Outra livre adaptação de outra passagem bíblica, a qual trata do Livro de Rute. Lançamento também previsto para o segundo semestre deste ano, pela Editora Naós.

VÓ CÓIA, novela, drama, inspirada no abandono de idosos. Provável lançamento, final de 2011.

A PÉROLA MAIS NEGRA, novela, dedicada a questão da promoção da igualdade racial. Lançamento para novembro de 2011

OBÁ OBÁ

Obá obá minha mãe
Obá olorum meu pai
Recebe o meu olhar
Me emana a tua luz

Do panteão onde tu estás
Me recebe
Me protege
Me olha
Me namora

Cuida de mim
Obá obá, meu pai
Obá obá minha mãe

ÁFRICA

África, a porta por onde passei
a porta onde deixei
a saída onde me arrancaram
me pisaram
me humilharam

África
mãe
chão
terra
fogo
ar

A ti quero voltar
A ti eu preciso me reencontrar

África
África
África

OSCAR HENRIQUE MARQUES CARDOSO

MINHA DECLARAÇÃO A TI, PELA MANHÃ

Eu te quero,
eu te desejo
eu me entrego a este amor

Eu quero
eu preciso deste calor

Que me entontece
que me enlouquece

E me instiga
me excita
a te amar
todos os dias
todos os minutos
todos os segundos

Porque te amar é viver
te amar é renascer

OSCAR HENRIQUE MARQUES CARDOSO

terça-feira, 10 de maio de 2011

ACHEI O AMOR NO PARAÍSO

Eu não acordei. Eu dormi. Eu atravessei um portal. Para onde fui, eu caminho pelas ruas onde emana leite e mel. As árvores são sempre frondosas, sempre há uma brisa a embalar os meus cabelos e a beijar o meu rosto. Assim que acordei, me vi com botas com salto de cristal. Caminhava pela calçada onde o chão transparente refletia embaixo as nuvens. Via as nuvens a passar embaixo dos meus pés. O céu estava sempre clarinho, sempre azul bebê. Pássaros gorjeavam e voavam, voavam em torno de mim, cantando. Sapos coachavam quase que sorrindo. Tudo era perfeito, lindo e belo. Assim era o que dizem ser o verdadeiro paraíso. Ali eu andava. Andava de botas, com uma belíssima saia rodada, com rendas, babados, uma blusa feita de tule, transparente, translúcida, a qual mostrava meu corpo, meu corpo em essência, sem carne e sem dor.
Ali, naquele lugar só emanava o amor. Andava com os cabelos soltos, com um gigante e enorme sorriso nos lábios. Estava bela, feliz e radiante. Andava e andava, com um lindo guarda chuva decorado. Era uma bela sombrinha de rendas e retalhos, para decorar o meu passear.

Andei e andei pelas calçadas transparentes. Cascatas de leite e mel emanavam. Carruagens de ouro passavam a meu lado. Cavalos belos, transparentes, carregavam as carruagens. Crianças corriam, coelhos pulavam, cães latiam e abanavam o rabo, gatos andavam pelas árvores, macaquinhos pulavam de galho em galho.

Um belo homem, todo de branco, de fatiota com uma beleza sem igual me deu a sua mão. Me convidou a caminhar com ele. Me recebeu. Disse que ali eu realmente conheceria algo que jamais imaginara. Era vida, era o eterno. Nem ele sabia dizer.
Só dizia que era uma paz profunda. Eterna. E chorava ao me falar do que havia sentido e encontrado ao chegar àquele lugar.

Um fruto tirou da árvore, me ofereceu. Comemos o fruto e seguimos a caminhar.
Paramos embaixo de uma árvore, defronte a um lago, de água mais do que cristalina. Ali, patos e gansos nadavam, cantavam. A imagem era belíssima.
A brisa me acalmava, me alegrava, não me incomodava.

Mas aquele homem me tranquilizava. Sentamos à sombra, comemos, conversamos, sorrimos, nos abraçamos e ali trocamos o primeiro beijo.Um beijo lindo e puro. O qual senti que me entrelaçava a seu corpo, a aquele homem.Ali passamos a andar, a caminhar. Pássaros gorjeavam em nosso redor. O vento nos levava a viajar. A passear, a caminhar sem cansar.

Encontrei o grande amor
Encontrei o paraíso
Estou feliz na imensidão

TUA TRAIÇÃO ME PERFUROU

A desforra e o despudor começaram
No dia em que tu olhou para aquela mulher
Para aquele corpo, para aquele olhar
Penetrou em ti como a espada que perfura a carne

Que me maltrata
Que me ata
A todo o sofrimento
A todo o condicionamento

A dor
Do horror
Do despudor

Já te amei
Já te desejei
Agora, te odiei

Me feriu com uma faca
Teu desamor me ataca
E me falece, me amortece