domingo, 22 de maio de 2011

MEU DIÁRIO DE MULHER DA CASA, DO LAR, DIÁRIO DA MULHER DO ZÉ

Dependente de mim, meu marido, José Antônio me pede tudo. Eu tenho que ser mulher de cama e de mesa. Pior, quando vou ao centro da cidade ele me pede para comprar meias e cuecas. Não são meias e cuecas claras que pede. Pede cuecas vendidas naqueles potinhos redondos, bem baratos mesmo. Não gosta de roupas íntimas caras. As meias, pede os pares vendidos pelos ambulantes. Não gosta de roupa íntima refinada. Também me pede para passar no mercado central e comprar rabada. Ele adora comer rabada com agrião. Mas a rabada tem que ser do jeito que faço, com muita pimenta e agrião.

Dependente de mim, José Antônio é assim. Eu tenho que acordar cedo, passar manteiga no pão, fazer o café com leite, o pão tem que ser novo, antes mesmo de o padeiro disponibilizar os pães na padaria. Eu tenho que levar o primeiro lote do pão fresquinho para casa.

José Antônio é um bom marido. Trabalhador, honesto, tem um escritório no centro da cidade. Homem de costumes simples. Bom marido, bom tudo. Na cama, faz o papai e mamãe bem feito, bem direitinho. Homem católico, devoto de Nossa Senhora. Gosta de tomar o mate quando chega em casa. Me dá atenção. É bom pai, preocupado com nossos três filhos. Sonha em ser avô. Meu filho mais velho, Ricardo, casou. Casou com Patrícia e ainda não tiveram filhos. Mas Ricardo sonha em dar um neto homem para nós. Um neto gremista, de preferência.

Nos finais de semana, o de sempre. No sábado, faço feijoada. No domingo, churrasco. O Zé vai pra churrasqueira, assa costela. Todos comem. Carne, salada verde, maionese, arroz, aipim cozido. Se sobrar um pouco da feijoada do sábado, não tem problema, vai para a mesa também. O feijão é aquecido na panela de ferro, no fogão à lenha que tenho ao lado da churrasqueira.

Minha vida é feliz. Sou uma mulher feliz. Fui criada para casar. Para ser dona de casa, para ter filhos. Para ser mãe. Mãe católica, mãe dona de casa. Mãe que visita também a sua mãe, que troca receitas de bolo, aprende a costurar melhor para acertar a bainha das calças do Zé e dos meninos. Também aprendo com minha mãe receitas caseiras para tirar manchas de roupas, para matar baratas e insetos. Também cuido do Faísca, o cusco que temos aqui em casa. O Faísca é o parceiro de todo mundo. Cuida do pátio e dá as suas saidinhas pelo bairro às vezes. Não sei se o Faísca me deu netos. Se virão aqui cadelas com sua prole latir a minha porta para cobrar pensão para o meu cachorro. Esta é ótima.

No verão, o programa é o de sempre. Vamos para a nossa casa de praia. Lá eu cozinho, lavo, passo, descanso um pouco, quando dá. Os meninos e o Zé vão, levam familiares, amigos. Nossa casa é sempre cheia. De dia, café da manhã bem tarde, praia, churrasco na hora do almoço. À noite, pego o casaquinho e vamos pro centrinho da praia, todos, para comer cheesburguer, tomar refrigerante e sentar na praça para ouvir a música que toca no alto falante.

Minhas amigas me convidam para tomar chá. Eu vou, ajudo no chá das senhoras. Participo do clube de mães. Às vezes converso na internet com elas. Também telefono e nós trocamos receitas de comida e também de como fazer artesanato para ajudar na renda de casa. Pinto panos de prato. Vendo e o dinheiro dos panos de prato eu também compro minha lingerie. Compro camisolas, compro calcinhas e sutiãs. Sutiãs que cobrem o bojo dos meus seios familiares. Dos seios que amamentaram os meus três meninos. Meus seios que nunca pecaram e que nunca deixaram o Zé abusar.

Sou uma mulher feliz, realizada. Tive meus filhos. Fui criada para casar, para ser mãe e esposa. Lavar, passar, cozinhar, criar os filhos e deitar com o Zé. Meu primeiro e único homem. Único que beijei na boca. Casei. Deus me livre beijar na boca um homem o qual não fosse meu marido.

Mas sou feliz. Nunca pensei em imoralidades. Nunca pensei em coisas, fantasias. Nada que saísse do controle. Mas sou feliz como sou.

É um pouco do diário da minha vida. Eu sou a mulher do Zé. Sou mãe desta família, todos precisam de mim. Todos dependem de mim. Não sei o que seria da minha vida se não tivesse a minha família, meus filhos, minha casa, meus bichos, minhas plantas, minhas coisinhas.

Sou feliz.

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