sexta-feira, 13 de novembro de 2009

ENTRE LOUVORES E AMORES, CAP.3

III
Rafael passa em um bar, perto de casa, toma uma cerveja e começa a pensar no encontro que terá. Seu destino, para aquela noite meio nublada e um pouco fria era bem quente. Para quem pensou que ele iria à igreja para assistir mais um culto de seu pai, se enganou. Aquela noite seria a "Noite do Visual" e Katy Lúcia faria um show de pole dance. Katy era apaixonada por Rafael e ele não se entregava aos encantos morenos daquela prostituta. Aliás, curtia como todos os homens, sempre prometia, na cama, que iria tirá-la daquela vida. Mas cumprir é que seria impossível.

Rafael chega à boate. É recebido com um selinho por Madame Perla, a dona do estabelecimento. Madame Perla também desafogava as mágoas com ele e, às vezes, com seu pai, o pastor João. Ah, pensou que o pastor só ficava na igreja o tempo todo. Misteriosamente, sem ninguém entender o que acontecia, pastor João era totalmente dominado por seu filho Rafael. As más línguas diziam que ele tinha uma paixão recolhida por seu filho. Outros diziam que ele tinha uma idolatria. Enfim, era uma relação de total domínio e passividade.

Madame Perla oferece um drink para Rafael. Os dois vão até o escritório da boate e Perla então começa a cobrar o rapaz:

- Rafael, quando é que você vai levar a minha pombinha? Katy não aguenta mais esta vida e tá apaixonada por ti.

- Eu não nasci para casar Madame. Eu não sou homem de ninguém. Para mim, tudo tá bom, tudo tá na boa, sem se estressar. Por que casaria com a Katy Lúcia? Só porque a gente transa. Aliás, eu pago a transa e deu.

- Paga nada. Tu não paga, assim como o teu pai também não paga nada quando vem aqui.

- Claro que a gente paga Madame... Quem paga o ponto aqui, quem paga a luz, a comida e a cerveja que vocês vendem? É dinheirinho limpinho, bonitinho, cheirosinho que entra aqui, ah, ah, ah, ah...

- Tu não presta mesmo. É que nem o safado do teu pai. Teu pai, pastor. Pastor só se for no raio da terra. Teu pai é um vagabundo velho. Eu conheço aquele safado desde a Bahia. Tu sabes que ele era picareta desde novinho. Dava golpe da bolinha nas pessoas, inventava show de mágicas. Teu pai então conheceu um velho, outro velho safado, o tal de seu Miguel. Seu Miguel armou um monte de golpes e depois disse que virou crente. Teu pai, depois de muito tempo me contou que leu a história do velho em um jornal e que havia pensado em seguir o mesmo caminho para se limpar. É inteligente o velho teu pai.

- Inteligente sim. Eu também sou. Sou mais inteligente que ele, que meus irmãos. Meus irmãos são uns babacas. O Alexandre foi embora pra Argentina. O Pedro é fora do ar e o Lucas é o anjinho da casa. Aquela mulher, a tal de minha mãe então, é uma insuportável. Não aguento ver aquela cara imunda dela. E passa imagem de boa mulher, mas é uma prostituta também. Meu pai tirou ela da casa da Dona Rosinha, lá em Minas, você sabe disso né Perla?

- É, meu lindo. Eu sei sim. A tua mãe é uma coitada. Tua mãe é uma mulher fraca, sem um pingo de maldade. Caiu na mão do golpista do teu pai, que aliás te fez muito bem feito. Eu não sei quem é melhor na cama, se tu ou o velho malandro. O velho tá cada vez melhor, é que nem vinho...

- Madame, eu não aceito perder pra ele não. Eu não aceito ser menos que ele. Se você ficar dizendo na minha frente, não te trato mais, velha suja.

- Calma, meu galinho de briga! É que tu sabes que eu sou louca pelo velho né. Ele casou com aquela sonsa da Rosana, mas não adianta, ele é meu. É marido dela, mas é meu homem na cama. Por falar em velho, ele não vem aqui hoje.

- Hoje não. Ele tem um evento lá na igreja. Ele e as suas bobagens. Queria que eu fosse para lá hoje para divulgar o balanço do semestre para os babacas dos funcionários. Eu ainda não terminei de falsificar o balancete. Falta pouco. Ah, o velha, aquele presentinho de R$ 5 mil tá na tua conta tá. Vou dar mais uns R$ 3 mil para a Katy Lúcia. Assim acalma e ela para de encher o meu saco com papo de casamento.

- Obrigado, meu lindão. Sei que tu não iria me deixar mal. Tô precisando mandar fazer uns vestidos novos pra mim. A Katy Lúcia vai é torrar tudo com perfume e com sapatos, só pra variar um pouco. Você não vai lá pra dentro da casa, vai ficar aqui tomando meu uísque. Se não vais lá pro salão, vamos pro quarto aqui do lado então.

- Velha, hoje eu não estou a fim de você não. Eu quero é duplo. Quero a Katy e a Furacão. Se o pai não passar aqui, eu falo contigo depois, tá bom, velhinha.

Rafael vai pra pista de dança. Vê o show de pole dance da Katy Lúcia e encontra com a Lúcia Furacão. Dá um beijo nela e pega uma taça de champagne. Toma junto com Lúcia, abraçado nela. Dança abraçadinho com Lúcia Furacão quando, do palco, Katy Lúcia desce e se junta ao casal. Os três dançam juntos uma música bem quente. E ali ficam, por um bom tempo. Ora Katy beija Rafael, ora ele beija Lúcia Furacão. Aquele rolo vai a noite toda. Os três não foram para o quarto. Lúcia largou os dois e foi dançar com outro cliente que estava na boate. Katy e Rafael vão para o quarto, transam e, depois Katy passa a falar com ele:

- Amorzão, eu quero dizer pra você que vou comprar aquele tecido para fazer o vestido do nosso casamento. Quero casar com um vestido longo, bem clássico, e na igreja lá do meu sogro querido.

- Deixa de ser ridícula, Katy. Se você começar com esta idiotice de paixão eu te largo tá. Não suporto papinhos de amor.

- Você nunca vai deixar esta tua frieza de lado?

- Não. Jamais. Não caso contigo e com ninguém. Não porque você é da noite, mas eu não caso porque não vim pro mundo pra isto. Você me entende?

- Não, Rafa. Mulher nenhuma que ama entende esta besteira. Você não pode exigir que eu aceite que você não vai casar comigo e com ninguém. Nós temos uma química na cama, entende. Eu não sinto nada parecido do que sinto contigo, entende?

- Não. Eu não entendo nada e não quero entender. É cama e acabou. Já tá sendo demais. Poderia pegar qualquer menininha, virgem, bonitinha. Tô aqui perdendo o meu tempo contigo.

- Podia mas não pega, Rafa. Você me ama, você me quer.

- Não. Não vou casar contigo e com ninguém. E chega deste papo. Vai te vestir. Volta pro salão e eu tenho que ir embora. Amanhã terei um dia pesado. Cheio de atividades, reuniões, coisas para fazer. E não posso chegar cansado.

- Rafa, uma hora vou cansar desta palhaçada sua, viu.

- Vai, cansa mesmo. Aí eu pego outra. A Lúcia Furacão é pra farra. Aí eu arrumo uma trouxa pra casar, fazer filho e manter a pose de paizinho. Tchau, Kate, sai fora, vai embora daqui. Ah, quem tem que ir embora sou eu, não?

- Vai sim, Rafael. Vai embora. Vou te esperar, sempre.

- Você é uma boa menina. Boa de cama, não é maravilhosa não. É boa, faz o arroz com feijão e deu. Tá bom, mas uma hora, vou querer mais.

Katy Lúcia se veste, chorando e sai do quarto. Rafael vai até o banheiro, toma um banho, se veste e vai embora. Volta para casa. Assim que chega, vê sua mãe, sentada na varanda. Os dois se vêem e uma discussão começa:

- Rafael, meu filho, até agora na rua...

- O que você tem a ver com a minha vida. Cuida da sua, que é já bem medíocre. Foi na igreja hoje à noite?

- Não fui. Minha vida não é medíocre. Sou mãe, sou esposa, sou mulher, e virtuosa.

- Sei. Tá, conta outra. Agora malandras que nem você são virtuosas...

- Chega, Rafael. Já não te bato mais porque não tenho mais forças pra isso. Não te surro porque já surrei, não te bato porque já bati. Não tenho mais como vencer o teu ódio.

- Você não me bate porque eu já disse que se você me tocar a mão eu te dou uma surra. Eu tenho ainda muita força pra te dar uma surra sim. Mas não faço isso porque não vale a pena perder tempo contigo. Se o papai que é o papai não perde tempo contigo, você acha que eu vou perder. Só o anjinho do Lucas mesmo.

- Filho que segue o que diz a Palavra de Deus. Filho que tem temor e que tem uma vida de honra.

- Já sei. Você vai dizer que é o meu contrário, não é, mamãe?

- Rafael, estou cansada. Estava aqui olhando para o céu e tentando dormir.

- Dormir no quarto de hóspedes, ou no do Alexandre. Com o papai, nem pensar, não é?

- Você sabe que... olha, Rafael, tenha uma boa noite.

- Com certeza, se não tiver mais que olhar para a tua cara, vou ter sim uma boa noite. Pelo menos, vou conseguir dormir.

João aparece na sala e vê mãe e filho conversando:

- Que bom vê-los aí. Conversando, desejando uma boa noite um para o outro.

- Papai, como você é idiota. Aliás, irônico é melhor. Não estava dando boa noite a ela não. Estava tentando chegar em casa e tive que dar de cara com esta mulher, na sala, dizendo que estava olhando para o céu. Estava na verdade me espionando, tentando controlar a minha vida. Como sempre, querendo dar uma de mãe.

- Ora, meu filho, mas você sabe que a sua mãe tenta manter a imagem de boa mãe, tenta ser dona de casa, mulher de pastor, tenta viver a farsa. Deixa ela representar direitinho.

- João e Rafael. Definitivamente, só Deus para me fazer suportá-los.

- Mamãe querida. O que me resta é te aguentar. Quem sabe um dia você morre e nos deixa em paz. Aliás, paz não porque ainda vamos ter que gastar com a tua morte, pagar enterro, fazer cerimônia para você.

- Rafael, você é muito ácido. Meu filho, não diga assim na cara de sua mãe. Não diga nada. Não perca seu tempo com ela. No teatro da vida, a ironia é o melhor roteiro.

- É João. É o que você fez comigo, com as crianças, e agora faz com aquele povo que vai na igreja. Um dia eu abro a boca e conto tudo.

- Vai abrir nada. Se abrir, já sabe Rosana. Só vai abrir, dar uma respiradinha e deu. Vai para baixo da terra. Se é que lá é o teu lugar. Acho que é mais embaixo ainda.


Mais emoções prometem.
Entre louvores e amores.

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